Opinião

Retórica da paz

17 mar 2022 15:45

Embrutecido por sempre ter vivido rodeado de guerras e as aceitar com vulgaridade

Há uns dias o meu filho, com a perspicácia dos seus doze anos, lançou-me de chofre uma pergunta que só mais tarde entendi ser retórica: Pai, qual foi a pior década na História da Humanidade?

E como todos os pais, tentei responder pronto, com a sabedoria e conhecimento que presumimos erroneamente que os nossos filhos nos atribuem, pensando que assim seremos sempre vistos como cuidadores e protetores da sua fragilidade: Talvez a segunda grande guerra mundial.

Não, argumentou ele, esta que estamos a viver. Vê só, a guerra entre Israel o Mundo Árabe, a guerra entre os Estados Unidos e o Estado Islâmico, a guerra de uma pandemia, a agressão da Rússia à Ucrânia.

Senti-me néscio e impotente. Embrutecido por sempre ter vivido rodeado de guerras e as aceitar com vulgaridade – afinal são tão lá longe e só indiretamente sinto as suas consequências.

Sem uma palavra, um pensamento, uma ideia que fosse, para dizer a uma criança que estaria sempre ali para o proteger e cuidar.

Por um acaso de calendário, na mesma semana fui convidado a estar presente na EB 2.3 D. Dinis para conversar com os alunos de uma turma do 7.º ano onde está também o meu filho.

O tema era teatro e havia umas cinco perguntas alinhavadas, coisa que se despachava nuns poucos minutos.

A generosidade da professora de Português e da Orientadora da Turma não me impôs limite de tempo, pelo que a partir das perguntas iniciais outras foram surgindo, umas atrás das outras, por cada resposta uma nova questão se levantava e durante duas horas um punhado de adolescentes obrigou-me a refletir sobre o mundo que estamos a deixar por herança aos nossos filhos.

Falámos das suas preocupações, dos seus medos e angústias.

Não chegámos a nenhuma conclusão, não encerrámos temas, não obtivemos respostas.

Fizemos perguntas uns aos outros e quanto muito concordámos que esta nova geração está muito mais atenta ao que se passa em seu redor do que a minha geração estava quando tinha a mesma idade.

Aprendi imenso com eles e vim alimentado da esperança que cuidarão do mundo muito melhor que nós, pais que apenas fomos capazes de lhes oferecer uma experiência distópica.

São crianças, julgamo-las desatentas do que se passa à sua volta, contudo já entenderam que a vida nem sempre é segura, que as ocorrências não são previsíveis, que a confiança nos Estados é coisa frágil.

Têm colegas ucranianos, russos, chineses, brasileiros e de outros cantos do mundo.

Vêm-se como iguais entre si, sem esquecer que são diferentes a seu modo pela matriz em que nasceram, mas capazes de viver lado a lado.

Sem nunca terem estudado filosofia, filosofaram que se o Homem fosse bom era desnecessária a justiça, e que se Homem fosse justo se evitava a solidariedade.

Ao invés de lhes explicarmos o desacerto deste mundo em que vivemos, melhor seria que escutássemos o mundo e as soluções para ele que têm para nos oferecer, que o futuro às crianças pertence e elas o querem de Paz.

 

Texto escrito segundo as regras do Acordo Ortográfico de 1990