Opinião

O que não é dito aos alunos de Economia

12 fev 2021 17:06

O que não é dito aos alunos de Economia é que um dos factores produtivos do PIB é um ser humano, tem alma, tem sonhos, sentimentos, e que o não aproveitamento do seu capital humano pode leválo à morte lentamente.

Apesar de ainda não haver dados oficiais sobre o PIB português de 2020, é-nos possível avançar com uma previsão não muito distante da realidade. Mas de qual realidade?

O PIB é um conceito bem definido no âmbito do Sistema de Contas Nacionais desde o fim da 2ª Guerra Mundial, mas qual é a leitura que o apuramento da sua métrica monetária nos permite fazer?

De acordo com a base de dados Pordata, o PIB português de 2019 foi 213.301 mil milhões de euros.

O governo, através do OE21, prevê uma queda do PIB em 2020 de – 8,5%. Portanto, o PIB de 2020 deverá estar na ordem dos 195.170 mil milhões de euros.

Entretanto, é uma informação assertiva de que o actual confinamento deva prolongar-se até ao final de Fevereiro. Nesse sentido, em termos económicos, o primeiro trimestre (1ºT) de 2021 poderá ser semelhante ao segundo trimestre (2ºT) de 2020 e apresentar um queda real do PIB (segundo o INE) de – 16,4%.

Isto significa dizer que o PIB português no início de Abril poderá ter um valor de 163.162 mil milhões de euros, i.e., um valor que nos pode posicionar ao nível da riqueza crida no País no ano de 2006, um recuo de quase 15 anos.

Será esta a nossa realidade revelada pelo PIB?

Regressaremos ao ano de 2006?

Aos alunos de Economia, é dito em sala de aula que o trabalho (a população activa de um país) é um dos factores produtivos da economia, utilizado no processo produtivo, criador de valor acrescentado bruto (VAB) e de PIB.

Mas não é dito ao aluno que o factor trabalho é um ser humano em acção social que em 2021 em nada será semelhante a 2006, a não ser no valor do PIB.

Nas últimas décadas, tem havido um consenso generalizado de que os recursos humanos (RH) têm representado a maior fonte de eficiência e de vantagem competitiva sustentada no âmbito das organizações.

O desempenho superior das organizações advém, em larga medida, do capital humano, i.e., o conhecimento, as capacidades técnicas, a competência no desempenho do trabalho, a experiência organizacional, a inovação, a criatividade, a escolaridade alcançada, a formação e até mesmo a saúde.

O capital humano é o investimento em RH no sentido de aumentar a sua eficiência, tornando-o num activo mais produtivo e menos custoso às organizações.

O prémio Nobel da Economia de 1992, Gary Becker, identificou três tipos de capitais na actividade económica: o financeiro, o físico e o humano.

E, para Becker, a diferença fundamental entre estes três tipos de capital é que o indivíduo (a força-detrabalho) é inseparável das suas competências, da suas capacidades e dos seus valores. E nesse sentido, o capital humano é biodegradável, sobretudo se não for utilizado.

No fim do 2ºT deste ano, o País poderá ter uma taxa de desemprego acima dos 10% e, durante o desemprego, o capital humano é deteriorado, na medida em que os trabalhadores perdem a oportunidade de manter e alavancar as suas competências que, com o decorrer do tempo, se vão tornando perecíveis.

O que não é dito aos alunos de Economia é que um dos factores produtivos do PIB é um ser humano, tem alma, tem sonhos, sentimentos, e que o não aproveitamento do seu capital humano pode leválo à morte lentamente.