Editorial

Mães contra o preconceito

2 mai 2024 08:03

Foi o recurso à canábis que lhes permitiu garantir melhor qualidade de vida aos seus filhos

Há utentes que comprovam a eficácia do produto. Há médicos que concordam e prescrevem e outros que se mantêm renitentes. O uso da canábis medicinal foi legalizado em Portugal há seis anos, mas em 2023, por exemplo, foram passadas pouco mais de mil receitas médicas em todo o território nacional. Uma prova de que o tema continua a ser controverso entre a comunidade médica, pacientes e público em geral. Por desconhecimento ou preconceito, ou pelas duas razões, só um debate mais profundo poderá ajudar a esclarecer.

Está comprovado, por estudos científicos, que a canábis ajuda a aliviar as dores associadas a doenças, como a esclerose múltipla, cancro e fibromialgia; contribui para minimizar as náuseas e vómitos causados pela quimioterapia; pode ser eficaz no tratamento de certos tipos de epilepsia e desempenhar um papel importante na regulação do apetite e do sono.

Como testemunham as mães ouvidas no trabalho de abertura deste jornal, foi o recurso à canábis que lhes permitiu garantir melhor qualidade de vida aos seus filhos. Mas para isso, uma delas viu-se obrigada a comprar erva às escondidas, a recorrer ao sub-mundo, para encontrar o ‘medicamento’ não convencional, que devolveria o apetite ao filho, depois de vários quilos perdidos fruto dos severos tratamentos oncológicos. E fê-lo a conselho do médico, especialista em oncologia.

A experiência desta mãe, associada à luta travada pela Associação Mães pela Canábis, demonstram que há ainda um longo caminho a percorrer para desenvolver produtos derivados de melhor qualidade, garantir o acesso universal a este tipo de tratamento e combater o estigma social associado ao uso da planta.

“Infelizmente, ainda tenho doentes que morrem à fome e por falta de hidratação, por recusarem consumir canábis. Isso é especialmente dramático quando são jovens e são os pais ou as mães que dizem que não querem meter o filho na droga”, lamenta Paulo Freitas Tavares, médico oncologista.