Editorial

E os ignorantes somos nós

19 ago 2021 11:00

Vivemos numa sociedade democrática, onde, entre outros direitos, deve ser respeitado o direito de opinião

O processo de vacinação contra a Covid-19 tem sido tudo menos pacífico.

É notável a logística que foi montada para garantir a inoculação do maior número de pessoas, no mais curto espaço de tempo, mas ainda assim, aqui e ali, têm surgido as incontornáveis vozes de insatisfação.

Umas por causa das longas filas de espera, outras pelo atraso na resposta ao auto-agendamento, outras ainda pelas dúvidas levantadas quanto aos possíveis efeitos secundários provocados por esta ou por aquela marca de vacina.

Portugal ultrapassou por estes dias a barreira do milhão de infectados e o dramático número de 17.500 mortes, por causa do vírus.

Desde o início da propagação, e ainda com os investigadores a tentarem descodificar o código genético do ‘bicho’, foram aparecendo as mais diversas conjecturas sobre a origem deste agente infeccioso, que até agora se revelaram falsas e sem qualquer fundamento científico, mas que serviram para alimentar ideologias e movimentos, engrossados pelos revoltados crónicos e pelos chamados negacionistas.

Vivemos numa sociedade democrática, onde, entre outros direitos, deve ser respeitado o direito de opinião.

E respeitar o direito de opinião passa também por ter a noção de que “a liberdade de cada um termina onde começa a liberdade do outro”, como assertivamente nos ensinou Herbert Spencer.

Quer isto dizer que todas as dúvidas são admissíveis e toleráveis, desde que as respostas a essas dúvidas não sejam apenas baseadas no ouvir dizer; nos discursos demagógicos e radicais; nas manifestações movidas pelo ódio ou, arriscamos dizê-lo, por alguns laivos de extremismo ideológico.

Está provado, por doenças como o tétano, o sarampo, a varicela, a rubéola, e várias outras, que a vacinação continua a salvar a vida a quase três milhões de pessoas por ano em todo o Mundo.

Todavia, em Agosto de 2021, continuamos a ser confrontados com teóricos que reclamam das medidas restritivas delineadas pelas autoridades de saúde e organizam manifestações contra a vacinação, porque acham que a doença não é real e que todos vivem num estado de alienação colectiva… Menos eles.

Temos pois, não uma, mas duas pandemias. A da Covid-19 e a outra.

Para a Covid já há imunização, ainda que não totalmente a 100%.

Para a outra, seria necessária uma vacina com elevadas propriedades de bom-senso.

Como esta não está ainda inventada, teremos de continuar a proteger-nos também dos que não acreditam no vírus, dos que abominam a imposição de regras sanitárias, dos que estão preocupados com tudo menos com o outro.