Desporto

O Xavier de Riade, 30 anos e dois netos depois

1 mar 2019 00:00

Passam três décadas desde que os portugueses conquistaram a Campeonato do Mundo de sub-20. O JORNAL DE LEIRIA recupera as memórias junto de quem nos proporcionou essa vitória

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Daniela Franco Sousa

A par de outras grandes figuras do futebol, como Paulo Sousa, João Vieira Pinto ou Fernando Couto, José Xavier foi um dos nossos heróis, que em 1989 trouxeram a Taça do Campeonato do Mundo de sub-20, de Riade, na Arábia Saudita.

Faz no próximo domingo precisamente 30 anos que este grupo de miúdos conquistou esse feito histórico. O JORNAL DE LEIRIA foi ao encontro de Xavier, o campeão que a Marinha Grande adoptou, para saber que memórias ficaram desses tempos de glória. O saldo é positivo. As histórias são muitas, deliciosas e merecem continuar a ser partilhadas.

“Carlos Queiroz? Cinco estrelas. Dos melhores treinadores que tive, ao nível técnico e do bom ambiente que criava no balneário”, recorda Xavier, que jogava a meio campo. “Fazia questão que fossemos a cantar durante as viagens de autocarro, para descontrair. Cantava-se o hino e tudo. Era uma família”, lembra o ex-jogador.

E era “uma equipa muito coesa, onde todos eram bons”. Talvez quem mais se destacasse fosse o João Vieira Pinto, mas por ser o mais novito, explica Xavier.

Cimentaram- se ali amizades que ainda hoje se mantêm. “Uns vestiam a camisola do Benfica, outros do Sporting, outros do Porto, mas encontravamo- nos muitas vezes fora de campo para tomar uns chazinhos”, brinca Xavier.

“Já há muito tempo que não estou com eles, mas sempre que estamos juntos a amizade que tínhamos perdura”, conta o antigo futebolista. “Eu? Era um jogador bom. Se não não tinha ido jogar pela Selecção.

Mas nunca levei o futebol muito a sério, não era profissional a 100%”, salienta Xavier. Acontece que lhe era difícil essa adaptação a tantas regras, essa imposição de deitar cedo e de cedo erguer, de não sair à noite. “E se saíssemos, como éramos figuras públicas, falava -se disso em todo o lado”, recorda o ex-jogador, que dos passeios na Arábia Saudita só se lembra de horaspara recolher e de percursos sob escolta policial.

Natural de Serpa, Xavier começou a carreira desportiva cedo. E já nessa altura sentia dificuldade em adaptar-se à rigidez das normas que lhe impunham. “Tinha 13 ou 14 anos e desatinei na primeira semana em que cheguei ao Benfica. Foram buscar-me”, recorda o antigo futebolista. Para José Xavier, o que mais importava era o prazer que retirava de cada desafio, “como naquelas partidas que fazia com os outros miúdos na rua”.

Por isso, quase nem se apercebeu do feito que foi ser vice-campeão europeu. E até mesmo vencer em Riade só se mostrou uma conquista de gigante quando foi confrontado com uma ovação durante a chegada a Portugal.

Talvez o seu percurso desportivo tivesse sido diferente, se tivesse outro acompanhamento. Mas Xavier não guarda boas recordações da única ocasião em que teve empresário a gerir- lhe a carreira. E também não existia propriamente a figura do psicólogo, de alguém que acompanhasse e orientasse os jovens talentos daquela época, nota Xavier.

Existiram, no entanto, duas grandes figuras que determinaram a vida profissional e pessoal do jovem, reconhece e agradece José Xavier. O jogador pertencia ao Benfica e estava emprestado no Estoril quando venceu em Riade. Mas anos depois, quando foi jogar para o Marinhense, contou com o apoio dos directores, Jorge Martins e António Santos, que, para o manterem ocupado, trataram de lhe proporcionar uma outra profissão para lá do futebol.

E é como chefe de armazém numa empresa de plásticos, na Marinha Grande, que o encontramos hoje. Diz-se divorciado do futebol. Até os jogos de cariz solidário passou a declinar. Teme por um joelho que nunca mais se recuperou depois de uma operação. Entre o grupo de amigos, todos sabem do seu passado glorioso e tratam-no orgulhosamente como uma estrela.

Mas Xavier, hoje com 49 anos, nem gosta muito que se saiba disso. Foi um passado feliz, mas é passado. “Hoje levo a vida pacata de um cidadão como outro qualquer, que se levanta para ir trabalhar e que tem tempo livre para sair e estar com os amigos. E também para acompanhar mais as filhas, a neta e o neto, como não pude acompanhar quando jogava futebol”.