Sociedade

Marco Moreira criou gorro integral para protecção do Covid-19 e ofereceu-o à comunidade

22 mar 2020 14:30

Criativo, natural da Nazaré, sublinha que o equipamento pode ser utilizado, mas que espera certificação do Instituto Ricardo Jorge

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Marco Moreira testou a estanquidade do equipamento com água e o líquido demorou uma hora e 45 minutos a penetrar o tecido
DR
Jacinto Silva Duro

Marco Moreira é arquitecto e designer de moda e é o responsável pela criação de uma cogula – uma espécie de máscara ou gorro integral, com touca incorporada - para protecção do pescoço, rosto e cabelo do pessoal médico e auxiliar que está nos hospitais portugueses a tratar de pacientes infectados pelo coronavírus Covid-19.

O equipamento espera por aprovação do Instituto Nacional de Saúde Ricardo Jorge, após solicitação de conformidade, submetida pelo criador natural da Nazaré e actualmente a trabalhar na Câmara Municipal de Odivelas. 

“Quero ter a certeza que a protecção que criei pode servir para utilização segura em ambiente hospitalar”, explica, adiantando que, mesmo utilizando a sua criação se deve sempre lavar as mãos - repetidas vezes -, desinfectar superfícies e manter o distanciamento social, entre outros comportamentos repetidos até à exaustão.

Neste momento e após Marco Moreira, 44 anos, detentor da marca de moda Mbut, ter disponibilizado o ficheiro digital do molde, há uma grande comunidade de influencers e bloggers a produzir cogulas em Portugal, incluindo na sua Nazaré natal, e até noutros países como a Argentina. 

A ideia é que não haja “quaisquer fins lucrativos” e que, quem puder ou tiver matérias-primas e estruturas, possa colaborar. “Quero que seja um projecto para todos.”

O designer, que chegou a criar modelos exclusivos de alta costura para Aurea e Cláudia Vieira, explica que a ideia surgiu após testemunhar, pela televisão, que os equipamentos de protecção em Portugal – uma máscara e uma touca – não davam uma protecção integral, como as que via serem utilizadas pelos clínicos chineses. 

Desenhou o modelo e, com a ajuda de um amigo, o designer gráfico Rui Tomás que transformou os desenhos do equipamento projectado em desenho CAD e ilustração, estava pronto para contactar uma loja na Amadora que tinha acabado de entrar em quarentena voluntária, mas que poderia fornecer o tecido não tecido de 70 gramas de que precisava. 

Após uma primeira resposta negativa, voltou a ligar, insistiu, insistiu e conseguiu um total de 300 metros do material, com um investimento inicial de 300 euros.

Fez testes às máscaras integrais para garantir a estanquidade da barreira de protecção às gotículas infectadas e concluiu que estas aguentam uma hora e 45 minutos, antes de começarem a deixar passar água. 

Na terça-feira, após contactos com empresas do Norte do País, deverá receber a primeira remessa de 500 cogulas que serão distribuídas pelas muitas solicitações que já teve. A Cabeceiras.pt ofereceu o tecido e a Pachecos Mobiliário pegou no molde e produziu as peças de equipamento de protecção.

O arquitecto e empresário Jorge Brandão Gonçalves, proprietário da empresa de estofos e mobiliário Cabeceiras.pt, explica que tinha os meios e a matéria-prima para produzir o equipamento. Aceitou colaborar e deu logo início à produção sem qualquer contrapartida financeira.
 
"Todos temos de fazer a nossa parte. Tinha na minha fábrica este material parado, que é o mesmo utilizado na Medicina e higiene pessoal em artigos como toucas, máscaras ou roupas hospitalares. Tenho também os meios e os contactos que o Marco precisava para fazer isto acontecer. Decidi avançar, não sou de ficar parado a ver as coisas acontecer. O que importa aqui agora é a vida das pessoas, é nisso que nos temos de focar. Recorri a outras fábricas com as quais tinha contactos para fazer os cortes do material e as costuras. Neste momento, estamos a produzir em versão relâmpago”, conta.
 
Outro dos empresários envolvidos no projecto foi Roberto Pacheco, da Pachecos Mobiliário, que disponibilizou o seu equipamento e equipa para ajudar a causa. “Não conhecia o Jorge Brandão, foi um conhecimento mútuo que nos pôs em contacto. Aderi imediatamente à iniciativa, é o mínimo que poderia fazer. Neste momento tenho a fábrica fechada porque as lojas fecharam também. Tenho toda a gente em casa. Abri a fábrica propositadamente para esta iniciativa e continuarei a fazer e a ajudar no que for preciso.”

Os gorros serão concedidos a título gratuito a enfermeiros e outros profissionais que, através das redes sociais, pediram para testar o modelo, com a salvaguarda, porém, de que não há garantia de eficácia cirúrgica. 

Por isso, Marco Moreira sente que, por ora, a utilização da sua criação será mais indicada para sectores que precisem deles por precaução, como os lares.

“Peço às pessoas que queriam colaborar que contactem as instituições próximas e se juntem a quem já está a produzir este tipo de equipamentos… e não se esqueçam que devem ser tecidos não tecidos com, pelo menos, 70 gramas”, solicita.  

Marco Moreira alerta para o facto de estas cogulas apenas poderem ser utilizadas uma vez.
 
Após isso, perderão a capacidade de criar uma barreira protectora.
 
E também não devem ser lavadas ou desinfectadas porque o tecido perde as suas capacidades impermeabilizantes. 

Neste momento, o arquitecto está em contacto com empresas do Norte do País para gizar a produção com “tecidos tecnológicos” mais avançados e que oferecem melhores garantias de protecção. 

Está também a testar novos materiais, como tecido de lençóis hospitalares descartáveis, cedidos por algumas unidades de saúde.

“Isto que aconteceu, mostra que, mesmo barricado dentro de casa e sem poder sair, se pode criar uma rede de ajuda e colocar toda a gente a mexer em prol do bem-comum.”