Sociedade

Anjos da guarda

7 abr 2016 00:00

A Equipa Local de Intervenção Precoce de Leiria dá apoio a crianças com problemas de desenvolvimento, até à sua entrada no 1.º ciclo. Constituída por técnicos especializados, contribui para o aumento da qualidade de vida das crianças e das suas famílias.

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Rafael, hoje com 3 anos, nasceu com problemas no coração e nos rins e teve diversas esofagites, que o obrigaram a sucessivos internamentos nos primeiros seis meses de vida. Males “menores”, porque já ultrapassados, tendo em conta que é portador de uma doença rara que o impossibilita quase de ver. Em resultado desse quadro clínico, a mãe e o bebé criaram uma relação de dependência pouco saudável. O apoio de uma docente de educação especial da Equipa Local de Intervenção Precoce (ELI) de Leiria foi determinante para os ajudar a viver com mais qualidade de vida.

“A mãe estava extremamente cansada, porque o Rafael só dormia ao colo. Tivemos de trabalhar a questão do sono para a ajudar a descansar”, explica Antónia Vindeirinho, 46 anos, docente de educação especial que acompanha semanalmente Rafael desde os 9 meses. “Tinha dificuldade em sentar-se e, como era muito inseguro e tinha medo, não saía do colo da mãe.” De início, reagiu mal quando era deitado na cama para dormir, mas depois adaptou-se. “A Antónia disse-me que tinha de o deixar chorar”, explica Ana Gouveia, 31 anos.

Mãe pela primeira vez, Ana não consegue precisar o número de vezes que foi ao hospital com o filho porque chorava muito. “Não sabia se era desconforto ou outra coisa”, justifica. Os problemas de saúde de Rafael deixavam-na insegura. “Tinha os olhos do tamanho de um adulto, mas não via nada. Só a luz muito forte lhe chamava a atenção.” As respostas médicas só surgiram quando tinha dois meses e meio.

Foi-lhe diagnosticada uma alta miopia no Hospital Pediátrico, em Coimbra, e aos quatro meses começou a usar óculos. “Chegou a ter 32 dioptrias”, recorda Ana. Hoje, apesar de ser acompanhado no Centro Cirúrgico de Coimbra por um especialista em genética do olho, ainda não se sabe bem o que tem. “Disseram-nos que era um caso único.”

A ELI de Leiria teve conhecimento do caso por técnicos do Centro de Apoio à Intervenção Precoce na Deficiência Visual, que acompanharam a consulta no Pediátrico. O passo seguinte foi contactar a família e disponibilizar apoio. “Foi muito importante para mim e para o Rafael”, assegura Ana. “Nunca pensámos na possibilidade de ter um filho com deficiência. Estes técnicos tornam as coisas mais fluídas, naturais e dão- -nos a conhecer outros casos”, acrescenta.

Aprender a brincar

“Eu não sabia como brincar com o Rafael”, confessa Ana. “A Antónia ensinou-me actividades para o estimular. Foi um passo muito importante, porque ele não tocava nas coisas.” Apesar de continuar com alguns medos, sobretudo dos ruídos, aos poucos, foi--se habituando aos jogos, ao barulho, à luz, graças ao apoio da técnica em educação especial da ELI de Leiria. “Como não vê bem, assusta- se e pede colo”, explica Antónia. Na sequência deste acompanhamento, os progressos de Rafael são evidentes. “Foi fazendo muitas conquistas. Com 2 anos já identificava as cores todas”, exemplifica.

Foi precisamente com essa idade que foi para a creche. Embora a mãe o levasse ao parque infantil e, pouco tempo antes, a visitar uma ama para se habituar a outros meninos, a adaptação não foi fácil. Contactar com sons que não lhe eram familiares deixavam-no confuso e assustado, pelo que chorava muito. Para facilitar a sua integração, Antónia passou a dar-lhe apoio em casa e na creche e explicou à educadora qual era a melhor forma de lidar com ele. “Para mim, a Antónia é da família. Este tipo de ajuda especializada é muito importante”, garante Ana.

Em Outubro, Rafael perdeu a visão total de um dos olhos, devido ao descolamento da retina. Os pais ouviram a opinião de diversos médicos e chegaram mesmo a deslocar-se a França, mas todos lhes garantiram que a operação não devolveria a visão a Rafael. Como tal, passou a frequentar, em Março, o Centro de Recursos para a Inclusão Digital (CRID), localizado na Escola Superior de Educação e Ciências Sociais do Instituto Politécnico de Leiria, onde é acompanhado uma vez por semana.

“O CRID tem outros materiais e outros recursos”, justifica Antónia. “Emprestam-lhe livros adaptados para ele levar para o infantário e mostrar aos amigos”, conta Ana. “É uma forma de criar mais interacção com os outros meninos”, acrescenta a especialista em educação especial. Apesar das dificuldades inerentes a quem mal vê, Rafael é uma criança com facilidade de aprendizagem. “Assimila toda a informação e tem um vocabulário muito rico”, afirma Antónia.

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