Entrevista

Bruno Gonçalves: "Portugal é um país social e institucionalmente racista"

10 dez 2022 14:00

O vice-presidente da associação Letras Nómadas, defende a criação de quotas para as minorias e denuncia a existência de pessoas de partidos de extrema-direita “a fazer o trabalho sujo de inflamar as instituições”.

Maria Anabela Silva

Como sentiu as palavras do Presidente da República que, numa mensagem evocativa do Dia da Restauração da Independência, lembrou os ciganos que “deram a vida” pela independência nacional?
Não deixei de ficar surpreso. Teve a coragem de falar dos portugueses ciganos e, ao mesmo tempo, deixar uma mensagem implícita aos partidos de extrema-direita que têm vindo a construir auto-estradas de ódio, sobretudo, com o foco nas comunidades ciganas. A mensagem é importante, mas não podemos ficar apenas pelas palavras e pelo reconhecimento. É preciso avançar com medidas políticas para fazer a reparação histórica da discriminação a que os portugueses ciganos têm sido submetidos. Não somos forasteiros. Estamos em Portugal desde o século XVI. Ao longo de séculos fomos alvo de medidas repressivas, como a ida forçada para as colónias ultramarinas, mas também fazemos parte da História de Portugal e lutámos pelo País. Há quem queira relativizar esta questão, minimizando a participação dos 251 ciganos na luta pela Restauração da Independência, dizendo que as pessoas foram forçadas a isso. Quem é que vai para uma batalha ou uma guerra com um sorriso aberto na cara? Ninguém. São relativizações idiotas, com o objectivo de tentar branquear e desvalorizar os actos desses portugueses ciganos. A história e o aparelho do Estado tentaram sempre branquear e omitir estes factos. Portugal é um país social e institucionalmente racista. Não quero dizer que os portugueses são todos racistas. Seria injusto dizer isso, porque não é verdade. Mas o sistema em si é ciganófilo e racista.

Falou em medidas de reparação. Quer dar exemplos?
As assimetrias só se combatem com políticas de afirmação positiva. Noutros países existem quotas paraas minorias. A representatividade nas instituições do País é constituída maioritariamente por pessoas brancas. Basta pensarmos em quantos portugueses ciganos ou afro-descendentes temos no Governo ou na Assembleia da República. As quotas podem ser um caminho, até que se normalize a situação, para reparar historicamente o que foi feito a determinados grupos, entres os quais, a comunidade cigana. É também importante fazer um retrato desta comunidade em Portugal, para sabermos quantos são e como vivem. Dizer que existem 37.500 ciganos no País é uma grande mentira. Seremos muito mais. Há outras áreas a trabalhar.

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