Opinião

Tito Larcher (II)

1 mar 2018 00:00

Das pessoas da mais elevada condição social desta cidade, muitos há – e entre eles professores – que, até hoje, ainda não visitaram as instituições.

É verdade que na imagem do criador da Biblioteca, do Arquivo e do Museu de Leiria, Tito Larcher (TL), sobressai a sua pouca contenção e o desprezo pelas hierarquias, a postura agressiva e a venenosa ironia com que se confronta com todos, amigos ou adversários confessos, que lhe negam o apoio às instituições que criou e defende numa entrega total.

E hoje entende-se melhor, como diz José Mattoso no prefácio a Tito Larcher: a Luta do Filantropo Austero e Erudito (ed. Arq. Dist. Leiria, 1997), de Acácio de Sousa e Ana Bela Vinagre, que as suas atitudes “não tenham sido as mais recomendáveis para conseguir aquilo que ele tanto desejava”, mas também que sem elas e sem a sua incansável luta em defesa do nosso património, do pouco que sobrou não tinha sobrado nada.

Regressemos ao Jornal de Leiria (JL) de há cem anos. Nos dias 12, 19 e 26 de Setembro (JL, nº 81, 82 e 83, 1918) TL dispara, numa longa entrevista, em todas as direções.

Primeiro situa genericamente as suas atitudes num quadro de equívocos dos quais o mais relevante é ter cometido o “erro grave” de acreditar que a cidade cuidaria com carinho da Biblioteca, do Arquivo e do Museu: desenganou-se, “(...) pois até o meio, devido a condições atávicas, atrofia todas as vontades e energias, anula todos os espaços que tendam a realizar qualquer empreendimento útil, e as diligências só se revelam no sentido de tudo envenenar e destruir. (...)”.

O esperado apoio dos cidadãos nunca se concretizou: “(...) Das pessoas da mais elevada condição social desta cidade, muitos há – e entre eles professores – que, até hoje, ainda não visitaram as instituições, e as que teem [sic] vindo não o teem [sic] feito com o fito de se orientarem sôbre [sic] a sua organização e utilidade, mas apenas para satisfazerem a sua curiosidade! (...)”.

Por exemplo: “(...)[O] professor do liceu, o sr. António de Sousa Monteiro, costuma dar anualmente um passeio pela cidade, com os seus alunos, para (...) lhes dizer alguma coisa sobre arte. Pois já por duas vezes o vi (...) dirigir-se à Igreja de S. Pedro (...) e mostrar-lhes o pórtico. (...)

[Depois] mostra-lhes o Castelo, cá de baixo, e não se digna entrar com eles no Museu!!”. Continuaremos aqui a prestar-lhe homenagem nesta espécie de triste folhetim. Até breve.

*Dramaturgo