Editorial

Não basta pedir perdão

9 mar 2023 10:10

Os bispos portugueses ou se deixaram cair na tentação do desnorte, ou, como costuma dizer-se, optaram por continuar a tentar empurrar o problema com a barriga

A última tomada de posição da Conferência Episcopal Portuguesa sobre os casos de abusos sexuais no seio da Igreja Católica soube a confissão sem direito a penitência. Os bispos confirmaram ter em mãos uma lista de nomes de alegados padres abusadores, alguns deles no activo, mas escudaram-se nos preceitos legais para adiar, mais uma vez, uma tomada de posição corajosa, que demonstrasse a tão propalada “tolerância zero” para com este tipo de abusos cometidos por clérigos.

Como acto de contrição, apenas um novo pedido de perdão às vítimas, a promessa de apoio psicológico a quem o solicitasse e o anúncio da construção de um memorial, que muitos consideram uma ofensa, por perpetuar o sofrimento dos abusados.

Quanto a eventuais indemnizações, nem pensar. E afastamentos ou suspensões preventivas de sacerdotes suspeitos também não. Justificação? Se houver lugar a compensações, deverá ser o abusador a fazê-las. E as limitações de exercício do ministério, só depois de um processo transitado em julgado, à luz do direito civil e canónico.

Num e noutro caso, os bispos portugueses ou se deixaram cair na tentação do desnorte, ou, como costuma dizer-se, optaram por continuar a tentar empurrar o problema com a barriga.

O pagamento de indemnizações às vítimas de abusos sexuais por parte de clérigos já aconteceu em vários países, como a França ou Estados Unidos da América, e a aplicação de medidas cautelares está prevista num documento com as directrizes para o tratamento dos casos de abuso sexual de menores no seio da Igreja, elaborado e publicado pela própria Conferência Episcopal Portuguesa, a partir das orientações da Santa Sé.

No ponto 61, do anexo 3, das referidas directrizes, pode ler-se que “uma medida cautelar não é uma pena, mas um acto administrativo”, e que “o aspecto não penal da medida deve ser bem esclarecido ao interessado, para evitar que ele pense ter sido julgado ou punido antes do tempo”.

Mais. No ponto 63 do mesmo documento, aconselha-se a “evitar a opção de realizar simplesmente uma transferência de ofício, de circunscrição, de casa religiosa do clérigo envolvido, pensando que o seu afastamento do local do suposto delito ou das presumíveis vítimas constitua solução satisfatória do caso”.