Opinião

Limpinho, limpinho

20 abr 2017 00:00

O futuro pavilhão multiusos de Leiria, denominado Centro de Actividades Municipal, ainda não começou a ser construído e está já envolto em alguma polémica.

A razão prende-se com o concurso público para o projecto de arquitectura e especialidades, que vários arquitectos acusam de ser descabido face à importância e complexidade da obra.

A própria Ordem dos Arquitectos tece duras considerações aos termos do concurso público, referindo que “não se coadunam com o consciente, regular e responsável exercício da profissão, contrariando os princípios e regras estabelecidas no estatuto da Ordem dos Arquitectos e no Regulamento Deontológico”.

Entre outras questões, são apontadas críticas aos prazos, quer os de entrega do projecto após anúncio do concurso, que foi de 40 dias, o mínimo permitido por lei, quer os estabelecidos para o anteprojecto e projecto de execução.

Prazos que, segundo acusações de diversos arquitectos e da Ordem, não são consonantes com as características da obra em causa, não sendo de estranhar, portanto, que apenas tenham surgido duas candidaturas, quando os valores e a notoriedade em causa fariam esperar muitas mais.

Na verdade, é difícil entender como se lança um concurso público internacional nestes termos para uma obra há tantos anos ambicionada por Leiria e que se espera que seja uma das âncoras da cidade, pelas suas funcionalidades, mas também que contribua para atenuar o impacto visual do elefante branco a que chamam estádio e do mar de alcatrão que o envolve.

Ou seja, face à importância da obra, esperar-se-ia um concurso público concorrido e com propostas distintas, que permitisse ao júri ter um leque alargado de soluções para serem estudadas.

A cidade, que espera já há tanto tempo pelo pavilhão multiusos, não se importaria, com certeza, de esperar mais dois ou três meses para garantir o melhor para um equipamento desta natureza.

Não se quer com isto dizer, naturalmente, que os dois projectos apresentados não têm qualidade, pois são ainda desconhecidos, como o deveriam ser os seus autores, que no meio todos sabem quem são e onde, inclusive, se antecipa um vencedor.

No entanto, será do senso comum que um maior número de propostas e de ideias elevaria a discussão e daria outra legitimidade e transparência ao que ali se vai fazer.

Quem elaborou os termos do concurso não entendeu dessa maneira, deixando espaço para que surjam considerações menos construtivas sobre o processo, que começa já envolto num ambiente de suspeição.

Não sendo possível anular o concurso, para clarificar as coisas e garantir que nada de anormal se passa, seria interessante que os promotores das duas candidaturas que se apresentaram disponibilizassem os seus computadores para confirmar que nenhum deles começou a trabalhar neste projecto antes do seu anúncio, na sequência de uma eventual informação privilegiada.

Seria uma forma de matar desde já qualquer suspeição sobre um concurso que, como diria Jorge Jesus, se quer “limpinho, limpinho”.

*director do JORNAL DE LEIRIA