Opinião

Leiria e a sua vulnerabilidade da água

7 mar 2022 16:00

Será que Leiria faz uso estratégico da sua água? A resposta é um rotundo não

Segundo o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), em finais de Janeiro 99,4% do território continental encontrava-se em situação de seca meteorológica.

A verdade é que existe um perigoso paradoxo revelado pelas sociedades: a água é um recurso natural escasso, mas é utilizado de forma ineficiente e esbanjadora como se fosse um recurso infinito.

Em Portugal, nos últimos 20 anos, as precipitações diminuíram cerca de 15% e a disponibilidade de água caiu 20%.

Prevê-se que os períodos de seca que ocorriam a cada 10 anos passem a ser de três a quatro vezes por década (Expresso, 18/2/22).

Portanto, a disponibilidade de água será uma vulnerabilidade cada vez mais acentuada nas sociedades. Portugal não sairá incólume das secas. E Leiria também não.

Portugal continental tem oito regiões hidrográficas (RH), sendo que quatro delas abrangem cinco rios que nascem em Espanha: Lima, Minho, Douro, Tejo e Guadiana.

Apesar de haver uma convenção de cooperação para as bacias hidrográficas luso-espanholas, grande parte da massa de água disponível em Portugal é partilhada com o território espanhol.

No caso específico de Leiria, existe a bacia hidrográfica do Lis (BHL) que é explorada de forma, no mínimo, pouco inteligível por parte do poder político local.

A BHL abrange uma área de cerca de 850km2 com drenagens de água desde as Serras de Aire e dos Candeeiros até ao limite norte com a bacia do Mondego. E a questão que se põe é: como é que Leiria faz uso da BHL?

A água, para além de ser um recurso essencial à vida, é também um recurso estratégico.

E será que Leiria faz uso estratégico da sua água? A resposta é um rotundo não!

Entre perdas e rupturas, o concelho de Leiria desperdiça cerca de 40% da sua água por ter um sistema de condutas envelhecido.

Mas poucos leirienses saberão que este ano o município vai comprar à Águas do Centro Litoral (AdCL) 4,8 milhões de euros de água.

Ou seja, 90% da água de Leiria é captada e tratada pela Estação de Tratamento de Água (ETA) do Paúl/Monte Redondo (Complexo da Mata do Urso) e que é explorada, via contratual, pela AdCL.

Ora, por se tratar de captação subterrânea na parte mais setentrional da BHL, torna-se impossível saber se água comprada e consumida em Leiria vem da BHL ou da bacia hidrográfica do Mondego (BHM).

É provável que seja uma mistura de ambas porque a ETA de Monte Redondo confina com a BHM em Pombal.

Mas a ausência de visão estratégica não passa apenas pela forte dependência de Leiria do Complexo da Mata do Urso gerido pela AdCL.

Em 2020, também por decorrência contratual, a ETA de São Romão deixou de fazer captações de superfície no rio Lis.

Ou seja, neste exacto momento, Leiria tem uma ETA equipada com tecnologia avançada, mas que está inoperacional.

A atitude estratégica para que o município não se tornasse demasiado vulnerável às captações da AdCL seria manter em funcionamento as captações do Lis pela ETA de São Romão.

Penso que poucos leirienses saberão o quão de vulnerabilidade é a nossa condição em relação à água.