Opinião

Chico-espertice

3 ago 2017 00:00

Tudo, é claro, para proporcionar o melhor aos seus filhos.

A contestação de alguns encarregados de educação quanto à forma como muitos alunos conseguem vaga na Escola Secundária Pedro Nunes e no Agrupamento de Escolas D. Filipa de Lencastre, em Lisboa, levando a que outros que residem mais próximos desses estabelecimentos de ensino não tenham lugar, mediatizou um problema antigo que acontece um pouco por todo o País.

Leiria, como se pode perceber no trabalho publicado nesta edição, não é excepção, com muitos pais a tudo fazerem para que os filhos consigam estudar em determinada escola, seja pela localização, seja pela oferta de transportes, seja ainda pela notoriedade que lhe é atribuída, aspecto que tem vindo a ganhar cada vez mais relevância desde que se começaram a publicar os famosos rankings, cujos estigmas que têm criado eram de todo dispensáveis.

Os métodos para alcançar a almejada vaga são conhecidos e não variam muito, passando normalmente por indicar como encarregado de educação um familiar ou amigo que resida na área de influência da escola pretendida, ou, simplesmente, por alterar a morada do aluno, aparecendo regularmente, inclusive, moradas falsas.

Sendo uma prática que causa injustiças e incómodos em muitas famílias, que se vêem obrigadas a colocar os seus filhos em escolas mais distantes do que a que lhes estaria destinada se a lógica fosse cumprida, além das consequências deturpadoras do que deveria ser uma das essências das escolas públicas e dos colégios com contrato de associação - diversidade social e cultural, criando no sistema de ensino escolas para uns e escolas para outros - seria de esperar que quem tem responsabilidades no assunto criasse mecanismos para controlar esta situação.

Não parece, aliás, que seja muito complicado fiscalizar a veracidade da morada dos alunos, pelo menos nos casos em que é evidente a artimanha, assim como deveria ser obrigatório que as razões para a mudança de encarregado de educação fossem bem justificadas, e que, obviamente, fosse a pessoa indicada a acompanhar o aluno todo o ano, sem excepções.

Nada disso acontece, bem pelo contrário, pois, como é sabido, a informação de como contornar a lei vem, frequentemente, do interior das escolas. No fundo, trata-se de mais uma “chicoespertice” tão característica do nosso povo que, no caso, não se coíbe de cometer uma fraude – sim, é esse o nome da artimanha – para enganar o vizinho e alcançar o que quer.

Tudo, é claro, para proporcionar o melhor aos seus filhos, mesmo que lhes estejam a ensinar que os meios justificam os fins e que tudo está bem desde que os interesses próprios estejam salvaguardados.

Ou seja, ao tentarem garantir, supostamente, a melhor educação para os seus, acabam por falhar logo no primeiro passo, que deveria contemplar a transmissão dos princípios básicos da convivência em sociedade, nomeadamente a importância do respeito pelos outros.

*Director do Jornal de Leiria