Economia

Reciclar é palavra de ordem na indústria de plástico

7 jun 2018 00:00

Na semana em que se assinalou o Dia do Ambiente, o JORNAL DE LEIRIA foi analisar de que forma estão as empresas a adaptar-se aos imperativos legais que condicionam a utilização do plástico

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Daniela Franco Sousa

Na semana em que se assinalou o Dia do Ambiente (terça-feira), o JORNAL DE LEIRIA foi perceber como estão as indústrias da região a reagir à legislação que tem apertado o cerco à utilização do plástico. Reciclar e apostar em produtos inovadores são as vias de sucesso encontradas pelos empresários com quem conversámos.

Pedro Colaço, presidente da Associação Portuguesa da Indústria de Plásticos (APIP) começa por assumir que “neste momento existem vários movimentos que, com diversas intensidades, estão a atacar a imagem do plástico.

Contudo, reconhece também que “os mais esclarecidos sabem que o plástico tem um enorme efeito benéfico na qualidade de vida das pessoas”. E exemplifica: “Imagine-se o que aconteceria aos prazos de validade dos alimentos se não existissem embalagens plásticas? E o carro? Pesaria mais 200 quilos se eliminássemos o plástico”.

Para Pedro Colaço, “eliminar o plástico é virtualmente impossível numa sociedade moderna” e “a sua substituição teria efeitos devastadores no ambiente”. Isto, “porque todos os outros produtos requerem mais recursos da natureza e mais energia para serem processados”, realça o presidente da APIP.

Feita esta ressalva, Pedro Colaço reconhece que há necessidade de mitigar o impacto desta indústria no meio ambiente, e diz que as empresas estão a trabalhar nesse sentido, em várias frentes. “Desde já, estão a aumentar a taxa de incorporação de reciclados”. Aliás, frisa o dirigente, “a indústria está sedenta de matéria- prima” e o problema está na recolha do plástico do consumidor, que “está longe de ser a ideal”. Mas até nesse campo existem compromissos voluntários das empresas para a redução de contaminações do ambiente e “apoia-se a recolha de plásticos do Oceano”.Além disso, “promove- se um novo design para maior circularidade e reciclagem”, expõe o responsável.

Amaro Reis, director-geral da empresa Sacos 88, também nota “que o que tem estado mais na ordem do dia, e que indústria quer seguir, é a aposta na economia circular”. Amaro Reis salienta que “a própria UE deu indicações para se criarem condições para que esta política possa ser implementada, sendo que as empresas de plásticos têm de seguir esse caminho”.

Na Sacos 88, “desde sempre defendemos a reutilização e reciclagem do plástico, visto ser produto 100% reciclável, o que muita gente desconhece”, expõe Amaro Reis. “A economia circular baseia-se na reutilização dos plásticos reciclados e sua transformação em novos produtos.

Para isso, estamos a desenvolver com os nossos parceiros melhorias na qualidade das matérias- primas recicladas, para que depois possam ser incorporadas em mais produtos. Com melhor artigo reciclado podemos usar mais dessa matéria- prima e fechar o ciclo da economia circular”, explica o director-geral.

No fundo, aponta Amaro Reis, “toda a indústria de plásticos sempre reutilizou desperdícios”. Só que hoje “as directrizes vêm dar razão ao que já era feito”. O objectivo passa agora por “ganhar escala e dimensão nesta política”, frisa o director-geral da Sacos 88. E antes de dizer mal do plástico, advoga Amaro Reis, também é preciso perceber a sua pegada ecológica em relação a outros materiais. E o facto é que “os nossos decisores penalizam produtos em vez de penalizarem atitudes”, nota o director-geral.

Lei dos sacos mudou mais as empresas do que o ambiente

Uma das decisões que mais recentemente afectou esta indústria foi a reforma da fiscalidade verde, aplicada há cerca de dois anos e meio. Alegadamente feita a pensar nas vantagens ambientais, a reforma acabou por ter mais consequências, e por vezes graves, na vida das empresas, do que propriamente no meio ambiente, apontam os empresários.

“A taxação de 500% sobre o saco de plástico fez com que o seu consumo praticamente desaparecesse causandopor isso graves problemas a algumas empresas que operam neste sector”, expõe Pedro Colaço. E ao contrário do que se pretendia, nota o presidente da APIP, “o consumo geral do polímero aumentou e recicla-se menos do que antes”.

Isto porque “o saco leve servia na maior parte das vezes para embalar o lixo doméstico. E o que passou a verificar- se foi um investimento das empresas, para a adaptação das linhas, para servir esta nova necessidade”. Acresce que “a receita fiscal praticamente nunca existiu” e “em termos ambientais não conseguimos ver beneficio, visto que todas as alternativas são mais gravosas para o ambiente, tanto do ponto de vista da descarbonização como da circularidade, como os estudos mais recentes têm vindo a provar”, defende Pedro Colaço.

Amaro Reis também enumera várias críticas à reforma da fiscalidade verde. “Com o desaparecimento daqueles sacos leves, que muita gente também usava para o lixo, as pessoas passaram a ter de comprar sacos do lixo. Mas estes são maiores, mais grossos e mais pesados. Por isso, se calhar a quantidade de resíduos existentes para triagem não baixou”, acredita o director-geral da Sacos 88.

Quanto à indústria de plástico, “adaptou-se, que remédio”. Amaro Reis recorda que “o impacto foi grande e o tempo para adaptação foi pouco. Então algumas empresas conseguiram reconverter-se mais rápido,outras mais devagar, e outras ainda hoje se ressentem, porque tinham feito investimentos de centenas de milhares de euros em máquinas que agora estão paradas”.

Desde que o País adoptou a reforma da fiscalidade verde, a Plasgal foi uma das empresas que se viu obrigada a rever a sua estratégia de actuação. Da produção massiva de sacos de plástico, destinada ao mercado nacional, a empresa de Leiria passou a focar-se sobretudo na produção de produtos técnicos, para dar respostas mais personalizadas aos clientes, e direccionou-se principalmente para o mercado internacional.

Com o objectivo de conceber novos produtos e de os canalizar para exportação, a Plasgal já investiu cerca de 500 mil euros em reajuste e aquisição de novos equipamentos e pretende vir a investir mais 400 mil, nos próximos dois meses, em tecnologia capaz de dar resposta às exigências dos novos mercados.

De acordo com Paulo Almeida, até à adopção da Reforma da Fiscalidade Verde, a empresa trabalhava sobretudo para produção de sacos de plástico para supermercados e tinha no mercado nacional cerca de 98% dos clientes. Mas, “amputada” por essa reforma, a Plasgal teve de se repensar. Cessou contratos com algumas pessoas, ajustou e adquiriu maquinaria e voltou-se para artigos mais personalizados, para nichos, como é o caso da produção de filmes para manutenção naval com características anti-fogo.

França e Espanha são os mercados onde a Plasgal tem vindo a posicionar- se melhor, captando o interesse dos clientes pela qualidade, mas também ao apresentar vantagens mais competitivas associadas ao transporte, porque apostou em parcerias com empresas italianas. Além destes mercados, a Plasgal trabalha também com a Suíça, Luxemburgo, Cabo Verde, Moçambique, São Tomé e Príncipe e Angola, acompanhando também o mercado britânico com muita atenção. A exportação representa agora 20% da sua actividade, percentagem que deverá subir aos 30% em 2019. Actualmente, a Plasgal emprega mais de 100 colaboradores e gera um volume de negócios na ordem dos 10 milhões de euros.

Nada se desperdiça, tudo se reincorpora

Por um lado, existe pressão contra o plástico, para que acabe. Por outro, preconiza- se a sua introdução na economia circular, observa o director- -geral da Plasgal, que vai observando este “cenário contraditório”, tentando “procurar oportunidades”. E enquanto este cruzar de ideias opostas acontece, na Plasgal “já se trabalha com plástico 100% reciclado”, sublinha o gestor. “Embora o mercado português ainda não esteja consciencializado, lá fora essa já é uma condição que se solicita bastante”, nota Paulo Almeida.

Trabalhar com plástico reciclado é também uma aposta da Sacos 88, que tem feito investimentos nesse sentido. Esta empresa de Leiria produz vários tipos de embalagens para o mercado nacional e exporta também para Espanha e PALOP. Tem cerca de 85 trabalhadores e um volume de negócios na ordem dos 15 milhões de euros.

Produz embalagens flexíveis para a área alimentar, para a grande distribuição, para agricultura, resíduos hospitalares, indústria e tenta diversificar ao máximo o seu portefólio. Encontra-se numa fase de aumento de capacidade de produção e também já investiu numa nova unidade de reciclagem do seu próprio desperdício.

“Todo ele é reciclado e incorporado no processo, não enviamos resíduos nem desperdício para fora”, sublinha Amaro Reis. “Queremos fomentar a directriz da economia circular junto dos nossos clientes para podermos fazer embalagens com menor pegada ecológica”, salienta o director-geral.

“Na Sacos 88 temos cerca de 50 a 60 toneladas por mês de desperdício interno, que é reincorporado no processo produtivo. E compramos muito material reciclado a empresas de reciclagem” aponta o responsável. Mas tem de haver diferenças. “Fabricamos sacos do lixo que são feitos 100% com material reciclado e não faz sentido usar materiais mais nobres neste produto.

Mas toda a embalagem que vai estar em contacto com alimentos é uma outra coisa. Não pode ser feita com reciclados”, exemplifica Amaro Reis. Mas, mesmo assim, estes artigos ainda poderão ser utilizados noutras embalagens.