Sociedade

Pedro Vieira e o surto de Covid-19: "Senti que era meu dever cívico ficar em Itália e proteger a minha família e terceiros"

21 mar 2020 19:57

Estudante de Leiria conta como está a gerir o isolamento (com a namorada) num pequeno apartamento em Turim

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Pedro Vieira chegou a Itália em meados de Fevereiro
DR

Pedro Vieira, de Leiria, é estudante de licenciatura (gestão), actualmente em Erasmus na cidade de Turim. Chegou a Itália em meados de Fevereiro e escolheu ficar no país, em isolamento voluntário, com a namorada, num pequeno apartamento.

A decisão de ficar
“Claro que a família fica preocupada e falava em voltar. Por várias razões decidimos não ir [para Portugal]. A primeira é a consciência colectiva. O que aconteceu no início, em que as pessoas fugiram do norte da Itália para o sul, para a Suíça, para o sul de França, foi crucial para o vírus se espalhar. Essas pessoas foram cadeias de transmissão. Senti que era meu dever cívico ficar em Itália e proteger a minha família e terceiros. Por outro lado, se voltasse para Portugal ia perder o que já tinha aprendido e tinha que voltar para Lisboa para as aulas e ia ser complicado acompanhar. A terceira razão é que apesar de os números serem assustadores, nós tendo aqui um espaço próprio estamos protegidos. Estou num apartamento com a minha namorada, que é portuguesa”.

A situação em Itália
“Hoje, foi a primeira vez que fomos à rua em 10 ou 12 dias. As pessoas estão com muito mais cuidado do que no início. Vê-se toda a gente de máscara, toda a gente de luvas. E muito mais apreensivas. Por exemplo, à porta do supermercado havia uma distância de três metros entre cada pessoa. A fila eram centenas de metros. Fomos às oito da manhã e estivemos 20-30 minutos para entrar. Não existe caos, os supermercados estão abastecidos, nesse sentido está tudo controlado”.

O que dizem as autoridades
“A explicação que dão [para o facto de o número de novos infectados não abrandar] é que temos de esperar o período de incubação do vírus, 14 dias, para ver os números a diminuir”.

A polícia nas ruas
“Nós temos vista para a rua e a polícia está sempre, sempre a passar, com altifalantes. Perguntam o que a pessoa está ali a fazer. Somos obrigados a ter um documento do ministério do Interior a justificar por que saímos de casa”.

O ambiente na cidade
“Fomos a pé [ao supermercado], são 15 minutos para cada lado. O ambiente é esquisito, porque, por exemplo, estamos no passeio e sentimos que as pessoas se afastam uma das outras. Isso sente-se muito. Depois, o interessante, é quase paradoxal, é que na fila as pessoas acabam por falar umas com as outras e discutir a situação. Sem dúvida, o estado de espírito é de esperança. Os italianos não perderam a alegria. Parece intrínseco neles”.

As aulas online e os exames
“Algumas ficaram online, em estilo Skype, e outras em diferido, em que os professores gravavam o vídeo da aula e colocavam na plataforma. O primeiro exame demorou quatro horas e meia e foi em Word. O professor fez-nos perguntas que obrigavam a pesquisar. O segundo exame, vai ser um exame de 15 minutos, em estilo Skype, em que as regras são muito claras e dizem que temos de estar sempre a olhar para o ecrã, não podemos olhar para a esquerda nem para a direita. Vai ser um exame de escolha múltipla no computador e respostas curtas”.

A rotina em casa
“Mentalmente, é uma luta. Temos uma varanda que tem luz directa do sol, de manhã estamos na varanda. Tive a sorte de trazer muitos livros, passo algum tempo a ler. Cozinhar e lavar a louça, só isso, actos tão simples na vida normal, já tem algum peso positivo”.

A família em Portugal
“Falamos todos os dias, sempre no sentido de acalmar a família o máximo possível. Sempre a dar garantia que estamos bem. Porque é o caso”.