Sociedade

O que é e quais as consequências da fractura hidráulica na exploração de hidrocarbonetos?

14 dez 2017 00:00

Processo tem defensores e detractores

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Jacinto Silva Duro

Na região, tem havido várias tentativas de extrair petróleo e gás natural. As mais recentes foram levadas a cabo pela Mohave Oil And Gas Corporation que chegou a propor fazer furos de prospecção a cerca de 700 metros do Mosteiro de Alcobaça, Património da Humanidade, classificado pela UNESCO.

Após vários anos a fazer testes, a empresa norte-americana contabilizou trabalhos de prospecção geofísica numa área de 160 quilómetros quadrados, repartidos por várias freguesias no concelho, tendo chegado à conclusão que a exploração por método convencional não era economicamente viável, embora tenha detectado a existência de gás natural no subsolo da região.

A alternativa poderá ser o processo de fractura hidráulica. Nas últimas décadas, a exploração de hidrocarbonetos por este método evoluiu bastante e, dizem os especialistas, perdeu muitas das características que lhe deram má fama.

Recorde-se os casos noticiados pela imprensa norte-americana da ocorrência “em número anormal” de doenças oncológicas, em zonas onde o fracking foi e está a ser usado, a contaminação de água e até os casos onde a água da torneira podia ser “posta a arder”, devido à contaminação com os reagentes usados no processo.

27 milhões de litros de água é quanto cada poço pode utilizar numa sessão de fractura hidráulica. Um poço pode ser fracturado até 18 vezes

“Ninguém conhece a composição exacta desses produtos”, sublinha o o porta-voz da Peniche Livre de Petróleo, Ricardo Vicente. Segundo pesquisa da Universidade do Missouri, EUA, que pode ser consultada online, a mistura contém anti-corrosivos, géis, aditivos de perfuração, bioquímicos, controladores de xisto, agentes líquidos, viscosantes e concentrados de gel líquido.

Os defensores do processo alegam que, actualmente, estes perigos estão praticamente solucionados.

Como se pode ler no site da Entidade Nacional para o Mercado de Combustíveis (ENMC), com a fractura hidráulica, “Portugal tem uma oportunidade de independência energética massiva”. Mas, embora promissora economicamente, a técnica controversa é criticada por ambientalistas.

Como se processa a fractura hidráulica? 
A extracção de gás natural por este meio é considerada uma alternativa diante do esgotamento das reservas naturais mais acessíveis. Para extrair o gás, é preciso, literalmente, liquefazer a rocha para que ela liberte os hidrocarbonetos no seu interior e, depois, bombeá-los para reservatórios. 

O processo começa com uma perfuração até a camada rochosa, muito abaixo da superfície terrestre (geralmente 1,500 – 6,100 metros), depois disso, uma bomba injecta água com areia e produtos químicos em alta pressão, estilhaçando a rocha. Cada poço possui uma mini-refinaria e um depósito e o conjunto tem um separador, uma vez que o gás sai do subsolo na forma líquida. Este separador aquece-o e evapora a água. Na operação, podem ser libertadas substâncias voláteis como o benzeno, tolileno e zileno.

O debate sobre as consequências ambientais, sociais, económicas e de saúde tem sido feito apenas recentemente e, essencialmente, por plataformas como a ASMAA, no Algarve, pela Peniche Livre de Petróleo e por autarquias como a de Alcobaça.

“No geral, os contratos são feitos nas costas de toda a gente”, acusa o porta-voz da Peniche Livre de Petróleo. A própria ENMC reconhece a falta de estudos sobre os impactos ambientais da prática.

O JORNAL DE LEIRIA enviou uma série de perguntas sobre o processo e os contratos de concessão Batalha e Pombal à entidade, mas após a confirmação de recepção das questões, não houve quaisquer respostas.

Outro dos problemas da exploração por fractura hidráulica é a utilização de grandes quantidades de água que, após a injecção no subsolo, ficará contaminada com reagentes químicos e hidrocarbonetos. “É preciso proteger os aquíferos”, exige Domingos Patacho, da Quercus. “Estamos a viver uma seca e, aparentemente, este é um estado que se irá repetir, com maior frequência, dentro do cenário de alterações climáticas, que prevê uma subida até 4º C, até ao ano 2100. Imagine-se uma indústria que consome milhões de hectolitros de água… a operar em tempo de seca”, condena Ricardo Vicente. Outro ponto questionado pelos ambientalistas é o facto de Portugal estar assim a investir na exploração de combustíveis fósseis, em vez de apostar em fontes renováveis. Segundo o Protocolo de Quioto, pelo menos dois terços das reservas mundiais de hidrocarbonetos devem permanecer no subsolo para evitar as alterações climáticas.

 

Reino Unido bloqueou Parlamento Europeu
Nas actas do Parlamento Europeu, pode ler-se, acerca deste assunto que, em 2013, um grupo parlamentar propôs que fosse sempre obrigatório um estudo de impacto ambiental, antes de se proceder a operações de fractura hidráulica, contudo o Reino Unido, um dos principais produtores de gás e petróleo através deste processo, bloqueou a criação de uma Directiva em Janeiro de 2014.

David Cameron, o primeiro-ministro britânico que marcou o referendo que levou ao Brexit, é apontado como uma das principais figuras que lideraram o lobby contra a intenção da comissão parlamentar, argumentando que já existiam “regras suficientes para manter o processo de fracking seguro” e que nova legislação apenas iria “atrasar investimentos e aumentar os custos”.

Como o processo legislativo foi bloqueado no Parlamento Europeu, a medida jamais chegou à Comissão e não foi produzida uma Directiva Comunitária abrangente.

Para Portugal, sobraria fazer como a Alemanha (2012), Bulgária (2012), Escócia (2015) e França (2011), que baniram a actividade por completo. Porém, por cá a lei que gere a prospecção e exploração de hidrocarbonetos é “antiga e desajustada”.

Pelo menos, esse é o entendimento da plataforma Peniche Livre de Petróleo.

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