Sociedade

É um ovni? Um avião? Chama-se hudeel e vem da Marinha Grande

24 abr 2019 00:00

Inspira-se no udu, um cântaro utilizado na Nigéria como tambor, mas adopta o desenho do udu utar, de Frank Giorgini.

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Parece uma escultura, mas é um instrumento de percussão imaginado, construído e comercializado por Daniel Reis, a partir da Marinha Grande.

O hudeel inspira-se no udu, um cântaro utilizado na Nigéria como tambor, em ritmos tradicionais e cerimónias, mas adopta o desenho do udu utar, criação, nos Estados Unidos, do artista Frank Giorgini, que está representado no Metropolitan Museum of Art de Nova Iorque.

Se Giorgini é considerado o pai do moderno udu, que importou de África, Daniel Reis substitui a cerâmica pelo aço e acrescenta notas, que podem variar, de acordo com a afinação em cada projecto, ao gosto do músico.

Actualmente, está a experimentar versões com três notas. Mas começou por desenvolver modelos de uma só nota, já exportados para França, Inglaterra e Estados Unidos, por valores entre 350 e 400 euros.

Tocado com as mãos, o hudeel, mistura de udu com steel (aço, em inglês), é tanto um idiofone, ou seja, produz som pela vibração do próprio corpo, como um aerofone, porque também produz som pela vibração do ar.

As características do metal e do tratamento que lhe é aplicado influenciam o timbre de cada hudeel e as técnicas em que Daniel Reis se apoia são semelhantes às que servem a construção dos chamados handpan, instrumentos de percussão derivados do hang, da empresa Panart. Desde logo, na definição da estrutura, tom e afinação dos dimples interiores e exteriores – as covas e cúpulas de onde são extraídas as notas musicais. “Um mundo que nunca mais acaba”, reconhece Daniel Reis, que trabalha numa pequena oficina equipada com prensas, martelos pneumáticos e todo o tipo de equipamentos indispensáveis para transformar ligas metálicas em arte.

Ele próprio tem experiência na indústria de moldes, mas é um autodidacta na teoria da música. O maior obstáculo que diz enfrentar é mesmo a afinação, um esforço de tentativa e erro. “É preciso perceber o que o aço nos está a dizer”, explica.

Desde há um ano, esta é a actividade principal do antigo técnico de climatização, agora decidido a apostar a sério numa paixão descoberta por acaso, há anos, quando uma amiga lhe enviou, por email, um vídeo do músico e compositor Manu Delago a tocar hang. Daniel Reis nunca tinha tocado nenhum instrumento musical, mas rapidamente começou a explorar as potencialidades dos handpan. Hoje dá concertos e tem dois discos gravados, o último dos quais, Pensamento, editado em 2016, está disponível na plataforma digital Bandcamp.

A internet também o ajuda no negócio: é online que chegam a maioria das encomendas dos suportes para handpan que fabrica na Marinha Grande – com a marca SPand – e também dos pudu que desenha em computador e imprime a três dimensões a partir de compósitos de plástico, madeira, mármore e bronze, ou seja, com a forma do udu e materiais mais resistentes do que o barro.

O próximo desafio passa por construir udu em alumínio, mas recorrendo ao antigo processo de fundição com moldes de areia.