Sociedade

Álvaro Órfão: “Quem resolver o problema do mercado mete uma lança em África”

7 jul 2016 00:00

O antigo presidente da Câmara da Marinha Grande critica um País que só vê Lisboa e um Estado para quem a floresta é uma “deusa intocável”

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Daniela Franco Sousa

Desde as primeiras eleições livres na Marinha Grande, a história da Câmara tem-se feito, alternadamente, pela CDU e pelo PS. Do seu ponto de vista, quem tem a esta altura melhores condições para ganhar as autárquicas?
Neste momento, dado o passado próximo, penso que o PS talvez sofra um desgosto nas próximas eleições municipais. Porque já está em queda. Nas últimas eleições perdeu um vereador, em relação às anteriores. Em dois mandatos a tendência tem sido para descer. Do ponto de vista ético, acho que não me fica bem pronunciar-me sobre as pessoas e a actividade dos que me substituíram. A única coisa que critico em relação aos meus sucessores foi a aliança que foi feita com o PCP. Acho que foi uma aliança que, neste local, não foi produtiva para os interesses dos marinhenses. É boa para resolver interesses partidários, mas não se aplica aqui. Aliás, nem nem em lado nenhum. Podem acusar- me de ser anti-comunista primário ou sei lá mais o quê, mas penso que o PCP, na situação doutrinária em que se encontra, tem poucas condições para fazer alianças com um partido democrático. Isto para além das alianças feitas, pró-governamentais, que envolvem interesses que penso que sejam de proteger.

A presença dos movimentos independentes na Câmara indicia fragilidade dos partidos políticos?
Indicia. À medida que se desinteressam pela vida partidária, as pessoas vêem na aparição de gente com ideias e com projectos, e que não se revê nos partidos, uma alternativa e dizem 'vamos experimentar isto que é novo'. Contudo, o enquadramento político não é muito bom, penso que ainda há muito a fazer para dar aos movimentos o valor político que eles representam no terreno. Nas instituições há coisas que não estão bem salvaguardadas.

Narciso Mota decidiu recandidatar-se à Câmara de Pombal. Para si, esta também pode ser uma possibilidade?
Nunca. Porque quando saí da Câmara, com 66 anos, reformei-me. E tinha sempre dito que o ideal dos mandatos autárquicos era terem uma duração de 12 anos. Está dito. Acabou. Nunca mais.

Como avalia as relações entre Marinha Grande e Leiria?
Têm tido altos e baixos. Penso que há condições para transformar esta região numa região de progresso e de inovação. A economia, do ponto de vista da iniciativa privada, tem feito mais do que as próprias entidades públicas. Mas do ponto de vista da cooperação entre as entidades públicas, mesmo assim, não é má. Na minha primeira candidatura, em 1993, nos meus planos tinha um parágrafo que era incentivar as relações do eixo Leiria- Marinha Grande. São palavras que voltam a aparecer, suponho que em 1995, num projecto que foi aprovado e transformado em lei, do ministro Valente Oliveira, onde se falava de áreas metropolitanas e havia precisamente este eixo.

Mas esta cooperação não tem servido para afirmar politicamente a nossa região em Lisboa...
Esta cooperação tem valido. Já valeu, ou não fosse a região da Marinha Grande e de Leiria superavitária. Apresentamos números que deixam algumas pessoas gagas. Mas Portugal tem uma tendência para a monstruosidade, que é ter cabeça mas não ter corpo nem pés. Se compararmos Portugal a um homem, temos uma grande cabeça sem mais nada. E não é em Lisboa que se faz tudo, que se progride e que se inova.

Quando deixou a Câmara era esta a Marinha Grande que esperava encontrar dez anos depois?
Houve duas ou três coisas que eu deixei bem encaminhadas, com as quais o Governo da altura não avançou logo. Disse que poderia pensar-se que eram feitas por eleitoralismo. Mas não fazer coisas com a desculpa de eleitoralismo é desculpa de mau pagador. No caso do Museu da Floresta, por exemplo, eu apresentei um documento, uma ideia bem esclarecida, onde já falávamos das acções, da intervenção do Museu na vida da cidade e do País. O objectivo era recuperar o edifício do Parque do Engenho, o acervo, as actividades, o antigo Comboio de Lata, que passava a fazer o percurso até ao Tremelgo. E não se conseguiu, porque se estavam a aproximar as eleições. Também deixámos na câmara um projecto, com maqueta, a realizar no Parque da Cerca, que era um centro de interpretação ambiental. Pelo que sei, essa maqueta desapareceu e depois apareceram ideias novas sobre o centro de interpretação, mas já não é a mesma coisa.

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