Sociedade

Combate às espécies invasoras, uma guerra que está apenas no início

5 jun 2022 16:29

Proliferação: Canas, acácias, erva-dos-pampas, chorão-das-praias ou vespa asiática são apenas alguns exemplos de espécies invasoras que se fixaram no nosso ambiente e precisam de ser controladas

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Remoção de chorão é uma das actividades realizadas ao longo da “semana das invasoras”
DR
Jacinto Silva Duro

Dizem que, se atirarmos uma rã para água a ferver, ela salta para fora, mas se a colocarmos em água fria até ferver, ela deixa-se ficar e morre. Passa-se algo semelhante na relação dos humanos com as alterações climáticas e com o impacto do Homem no ambiente.

A memória é curta e, por vezes, coisas que nos parecem normais, nunca o foram. Apenas nos habituámos a elas, mas isso não quer dizer que tudo esteja bem. Nas linhas de água, não estranhamos ver cerrados canaviais e dezenas de lagostins vermelhos por metro quadrado.

A proliferação de espécies invasoras e regressão das autóctones é um sinal evidente de que algo está errado. Mas há cada vez mais pessoas despertas para a problemática e a agir, mesmo que não haja uma política governamental concertada.

No final do mês de Maio acontece todos os anos a Semana Sobre Espécies Invasoras Portugal & España cujo objectivo é aumentar o conhecimento da população sobre espécies invasoras que podem ter um impacto significativo na saúde pública, na biodiversidade e a nível sócio-económico, na Península Ibérica.

Este ano, a acção contou com 250 actividades de mais de 230 entidades aderentes, com eventos dinamizados de forma prática em campo ou através de palestras e divulgação de conhecimentos. Este ano, Os Amigos do Arunca, foram uma das entidades envolvidas na “Semana das Invasoras”. Emanuel Rocha, da associação ambientalista de Pombal diz que, no grupo, o sentimento é de que “Pombal já colocou na agenda o controlo das espécies invasoras”.

As Juntas de Freguesia do concelho foram desafiadas a participar formal ou informalmente e combateram a erva-dos-pampas no Bioparque de Pombal, no âmbito da campanha “Dar cabo das Pampas”, na União de Freguesias de Guia, Ilha e Mata Mourisca o mote foi Chorão-das-areias, na minha escola é que não!, enquanto a freguesia de Abiul optou por um trabalho de sensibilização para a problemática.

Foi ainda realizado o controlo de canas no Açude da Flandes, e o rastreamento de espécies autóctones, exóticas e invasoras na zona urbana de Pombal. Os impactos mais óbvios, por existência de espécies invasoras, são sentidos na biodiversidade, mas atingem outras dimensões insuspeitas.

O fenómeno da reprodução descontrolada de uma espécie exótica num cenário onde, anteriormente, ela não existia, actualmente, é a quinta maior ameaça ao equilíbrio dos ecossistemas. “Urge que o Município de Leiria ou a Comunidade Intermunicipal da Região de Leiria (CIMRL) crie uma carta de invasoras. Temos muitas espécies implantadas e a situação é preocupante tanto em ambiente terrestre como aquático”, alerta o presidente da associação ambientalista de Leiria, OIKOS, Mário Oliveira.

O responsável diz que a situação é dramática. “Andámos tanto tempo a descurar a situação, que será muito difícil controlar as espécies sem um gasto significativo. E isso irá implicar a melhoria das práticas de limpeza das linhas de água e a protecção da floresta.”

O ambientalista defende uma política concertada de acção, para tentar mitigar o problema e o mapeamento, para se saber onde estão as espécies e o seu desenvolvimento, tudo a curto prazo. “Tem de ser uma acção intermunicipal porque só assim se perceberá os riscos para a biodiversidade e para a perda irreparável de espécies que cá deveriam estar.”

Elizabete Marchante, investigadora e especialista em Ecologia da Universidade de Coimbra, é uma das promotoras da Semana sobre Invasoras e dá mais exemplos.

Os jacintos de água, que se espalham até ser impossível utilizar os espelhos de água, asfixiando mesmo espécies animais. “As invasoras têm também impactos económicos muito importantes. A quantidade de dinheiro que se gasta nas vias de comunicação para as controlar é incrível! E há ainda os impactos na produção agro-alimentar”, afirma, chamando a atenção para as doenças respiratórias.

“Como as ervas-dos-pampas e as acácias libertam pólen mais tarde do que as outras espécies autóctones, começam a aparecer novos picos tardios de alergias, normalmente mais para os meses do Verão, quando já não deveriam acontecer.”

Já a bastonária da Ordem dos Biólogos, Maria de Jesus Fernandes, traça a riscos grossos o que se passa no território do distrito. “Há uma faixa de lenhosas, constituída por acácias, quase contínua, no litoral.

Na zona sul, verifica-se uma invasão impressionante, de dimensão assustadora de erva-dos-pampas. As pessoas acham que é uma planta bonita e têm dificuldade em perceber o quão importantes são os planos de identificação e controlo sustentado da espécie.”

A especialista diz que está a ser levada a cabo uma experiência com um insecto, importado da Austrália que faz com que as acácias desenvolvam galhas e reduzam a quantidade de semente produzida, mas que é importante manter a monitorização do trabalho.

“É preciso dar um fim económico àquela madeira. Gastam-se milhares de euros para fazer o controlo e o resultado é minimalista. Temos o País coberto disto!”

Invasores mais comuns

Elizabete Marchante explica que este tipo de acções, quando passam por actividades de controlo, servem para também para identificar e mapear locais onde estas espécies estão mais presentes.

Este ano, a Semana Sobre Espécies Invasoras Portugal & España teve um grande número de parceiros, talvez porque o tema faz cada vez mais do conhecimento do público. Autarquias, sejam elas câmaras ou juntas de freguesias, comunidades intermunicipais, Agência Portuguesa do Ambiente, Agência Ciência e Vida, centros de investigação, Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, universidades e até escolas do 1.º Ciclo, que foram para o campo ou promoverão simpósios de informação, foram algumas das entidades, que se juntaram aos cidadãos voluntários no esforço de combater pragas como os conhecidos chorão-das-praias, acácias, erva-dos-pampas ou, a mais recente, fallopia-japónica-sanguinária-do-Japão, planta de grande porte, até três metros e com raízes que atingem igual profundidade, que se reproduzem muito facilmente a partir de pedaços tão pequenos quanto um centímetro, pelo que nem após trituradas desaparecem.

No reino animal, o invasor que, neste momento, está na boca de toda a gente, é a vespa asiática ou velutina, predadora das abelhas melíferas, mas o campeão dos invasores em Portugal e Espanha, é o lagostim-vermelho- do-Louisiana, introduzido em charcas no início dos anos 80, por pessoas pouco informadas. Sem predadores naturais, contamina, neste momento praticamente todos os corpos de água da Península.

“Já não se consegue eliminar. Está muito disperso. As lontras alimentam-se deles, mas o seu impacto é enorme, destroem anfíbios e peixes e fazem grandes estragos nos arrozais”, diz Elizabete Marchante.

Recentemente, foi autorizada a sua apanha com fins comerciais, para produção de patés e alimentos processados. Intencional ou acidentalmente, o ser humano é o responsável pela introdução destas espécies e de outras, como a tartaruga verde, que é um conhecido animal de estimação, mas que, quando cresce, é rapidamente descartado e abandonado no meio ambiente, onde pressiona, ainda mais, as já ameaçadas espécies autóctones de cágados-mediterrânicos e cágados- de-carapaça-estriada.

Nos principais rios, há gigantescos lúcios e achegãs, peixes carnívoros predadores, muito apreciados pelos pescadores, que, ainda hoje, os introduzem às centenas para competições de pesca, com os previsíveis impactos nas populações de peixes, anfíbios e até de pequenas aves. Para ver uma lista completa destas espécies exóticas, consulte o site https://invasoras.pt.

 

Gato doméstico
Mais caçador do que uma chita
Sabia que, apesar de não ser reconhecido como espécie exótica e invasora, o impacto do seu gato no meio ambiente pode ser enorme? Quando deixado à solta ou assilvestrado, é o mais bem- -sucedido dos caçadores felinos. Tem mais sucesso do que uma chita, o mais rápido animal terrestre da actualidade e adora caçar e brincar com a comida até a matar. Há quem fique contente ao ver o gato trazer para casa ratos, osgas, rãs ou passarinhos como prenda, mas atenção que alguns destes animais estão em perigo de extinção. Na Madeira, por exemplo os gatos abandonados nas serras são uma ameaça séria para a colónia de “freiras da Madeira”. Para quem olha para o seu animal de estimação a fazer travessuras ou a dormir tranquilo, pode ser difícil aceitar isto, mas é preciso estar mais alerta.