Opinião

“Na natureza, não há velhice nem decrepitude”

7 jul 2023 11:30

Gostei que estes dois autores me explicassem o porquê de na natureza só haver plenitude e morte e de nela não haver lugar para a velhice e para a decrepitude

Quando se lhe acrescenta o amor (digo eu) “na natureza, não há velhice nem decrepitude, só há plenitude ou morte”.

Fui uns dias de férias. Sim, fui de férias porque a minha vida não findou por já não ter um patrão e ser considerada uma idosa. Nestas alturas preparo um dos enormes prazeres que as férias me proporcionam: o de poder ler sem interrupções os livros que escolhi levar comigo! Prazer este que começo a sentir logo quando me ponho, hedonisticamente, “à pesca” do que quero ler.

Desta vez, na insubstituível Arquivo, “pesquei” de Juan Millas e de Arsuaga” A Morte contada por um Sapiens a um Neandertal”. Não sei, mas penso que esta minha escolha está relacionada com o facto de andar a sentir a necessidade de atribuir para a condição que me impõem de idosa um sentido ligado à vida e não à decrepitude. E acertei! Gostei que estes dois autores me explicassem o porquê de na natureza só haver plenitude e morte e de nela não haver lugar para a velhice e para a decrepitude.

Dizem-me eles que na natureza nenhum animal envelhece porque antes que tal aconteça ele morre. Contam-me também que o conceito de envelhecimento surge quando nos humanos e nos seus animais domésticos a vida lhes começou a ser prolongada “artificialmente”.

Em suma, cheguei satisfeita à conclusão de que também os humanos enquanto, com mais ou menos drogas e remendos, se mantiverem funcionais estarão na natureza apenas classificados como vivos!

E foi sentindo-me viva que tive oportunidade de em Santa Luzia de Tavira, no “Alcatruz”, me deliciar com o melhor arroz de ameijoas que alguma vez comi e que na aldeia alentejana de Santa Susana, no “Coelho”, com uma sopa de cação, o mesmo me tivesse acontecido.

Curiosamente, foi também por causa desta caraterística de na natureza só existir plenitude ou morte que não fiquei tão triste ao ver as dezenas de trabalhadores imigrantes, vindos de longínquos continentes, sentados à noite num qualquer banco de jardim colados aos telemóveis com que se sentem a abraçar as suas famílias.

Eles estão vivos e mostram, ao insistirem em permanecer aqui, apesar de tantas vezes maltratados, que estão bem apetrechados para continuar. Porém, ao ver alguns com semblantes tão tristes em corpos tão desamparados, pus-me a pensar que também eles, tal como eu, não precisam de rótulos.

Precisarão, isso sim, de que do lado de fora alguém lhes faça chegar, não as minhas drogas e remendos, mas o amor indispensável à dignidade a que têm direito!

Millás e Arsuaga dizem-me que “na natureza, não há velhice nem decrepitude, só há plenitude ou morte” pois será, mas para mim que nasci pessoa, nessa mesma natureza, tal só será verdadeiro se o amor saído dos nossos corações, nessa natureza sem alma, se impregnar!