Opinião

Música | Eu estou aqui e tu não

12 dez 2025 08:54

É a cena do FOMO (Fear of Missing Out), sigla inglesa que significa o medo de ficar de fora, uma “nova” ansiedade social

Há uns dias foram anunciados os concertos da Rosalía em Lisboa. Depois do impacto que o mais recente disco teve, era de prever mais uma corrida aos bilhetes. Eu, que ainda ando a tentar perceber se só gosto ou se gosto muito do álbum, fiquei tentado em ir ver um dos concertos em abril do próximo ano. Inscrevi-me no website da artista e recebi um e-mail a dizer que no dia 9 de dezembro iria receber um código para comprar bilhetes. Assim foi. Cliquei no link que me enviaram e fui reencaminhado para uma fila virtual com tempo de espera de aproximadamente uma hora. Diziam para não fazer refresh. Tudo certo. Chegou a minha vez e já só havia bilhetes a partir dos 90 euros. Fiz as contas e pensei: será que eu e a família gostamos assim tanto disto para gastar 270 euros de rajada? Desisti da compra e fui ver se ainda havia bilhetes para o Morrissey em Sevilha. Havia, mas só a 135 euros. Surgiu então uma pequena reflexão.

A partir dos anos 90, os grandes nomes da pop mundial começaram a vir tocar a Portugal, antes disso alguns músicos de renome passavam por Cascais e organizavam-se excursões a Madrid. Em 1988, falou-se em 10.000 portugueses para ver o Bruce Springsteen no estádio Vicente Caldéron. Eu era um deles.

Não era muito difícil conseguir bilhetes nessa altura. Tirando os Pixies em 1991, que esgotou muito antes do que se estava à espera, conseguia-se comprar bilhetes na véspera e até no próprio dia. O que seria hoje um concerto de David Bowie (1990) ou Michael Jackson (1992), que na altura não esgotaram os seus concertos em Alvalade? Aliás, a seguir a Alvalade, Bowie regressou a Lisboa em 1996 e as vendas estavam tão em baixo que a organização do Festival Super Bock Super Rock abriu as portas para o pessoal entrar gratuitamente. Portugal jogava na mesma noite contra a República Checa, jogo dos quartos de final do Europeu de futebol. Pois.

Numa entrevista, Rui Vargas falava que agora as pessoas estão na pista da discoteca Lux, em Lisboa, onde é DJ residente desde 1998, a assinalar o momento nas redes sociais como se estivessem a dizer: “eu estou aqui e tu não”. É a cena do FOMO (Fear of Missing Out), sigla inglesa que significa o medo de ficar de fora, uma “nova” ansiedade social que leva as pessoas a terem de provar online que estão a viver experiências incríveis. E a corrida aos bilhetes para o espetáculo de Rosalía também é isso: “eu estou aqui e tu não.” Ou como diria António Variações: “estou bem aonde eu não estou, porque eu só quero ir aonde eu não vou”.