Opinião

Cinema | A Caixa de Pandora

20 mar 2020 20:00

Na lenda grega, a bela e virtuosa Pandora, criada pelos deuses, não resiste à curiosidade e abre uma caixa, de onde saem todos os males do mundo.

No fundo da caixa fica a esperança. A esperança sempre foi o grande motor do melodrama de Hollywood.

Quem não se lembra da inesquecível frase de Vivien Leigh em E Tudo o Vento Levou (Gone with the Wind), de 1939: "depois de tudo, amanhã é outro dia (After all, tomorrow is another day)".

Será pelo menos desde a Grécia antiga que teremos consciência da importância de vermos, de sentirmos a tragédia na ficção, de como é catártico chorarmos, sofrermos e termos empatia por personagens que não são reais.

Em filmes como A Escolha de Sopia (Sophie’s Choice), de 1982, realizado por Alan J. Pakula, se há alguém com a capacidade de nos fazer chorar será certamente Meryl Streep.

O chorar com a ficção é certamente uma boa terapia para combater a ansiedade, acalmar os nervos. Talvez seja mais fácil chorar das tragédias dos outros do que das nossas tragédias reais. E chorar é importante, para nos acalmarmos. Chorar faz-nos menos tristes.

A tragédia é um entretenimento fundamental em tempos de crise. Mas porque muitas vezes as questões mais sérias estão melhor explicadas nos filmes para crianças, esta questão da importância da tristeza é sublimemente elaborada no filme Divertida-mente (Inside Out), de 2015.

Neste filme, a acção decorre no cérebro de uma menina e nela vemos como um dos elementos do cérebro, ao querer evitar constantemente a tristeza, leva ao agudizar do problema.

Neste filme, as crianças aprendem que a tristeza é importante, que por vezes é importante que os outros percebam que estamos tristes, para nos ajudarem, que é importante mergulharmos um pouco na tragédia, para depois voltarmos à superfície, voltarmos a ter esperança.

Talvez um dos grandes problemas desta nossa vida acelerada, mais do que o tempo para rir (as redes sociais, as televisões, por todo o lado vivemos num mundo que nos quer provocar um riso fácil), seja carecermos de tempo para chorar, para aliviarmos as nossas dores e ansiedades e depois sim, de seguida, abraçarmos o riso com mais gosto.

Depois de uma boa sessão com um filme que nos faça questionar o sentido da vida, da morte, do espírito; filmes como por exemplo Solaris, de 1972, de Andrei Tarkovsky, ou Manhã Submersa, de 1980, de Lauro António, vermos um filme que nos faça rir, como o clássico A Vida De Brian (Life of Brian) de 1979, dos Monty Phyton: a alegria será certamente mais plena.

A tristeza aguça a alegria do mesmo modo que o sabor do sal acentua o doce. Muitas vezes é importante sucumbir à tristeza para compreendermos  onde está a esperança, neste mundo que é uma caixa de pandora.