Opinião

Um coração, dois países

4 abr 2019 00:00

Mais do que sentirem-se portugueses ou franceses, ou alemães, sentir-se-ão europeus.

Não é novidade para ninguém que Portugal é um país de emigrantes e de imigrantes. Foram milhares os que nas décadas de 60, 70 e 80 do século passado deixaram o País à procura de melhores condições de vida na Europa.

Em muito contribuíram para que países como a França, a Alemanha ou a Suíça sejam o que são hoje.

Para os portugueses dessas gerações, o sonho de regressar à terra natal, melhor do que tinham partido, comandava a vida.

Mas para os seus filhos, muitos já nascidos nesses países, isso rapidamente deixou de fazer sentido. Não significa que se tenham perdido os laços com Portugal, onde continuaram a vir, até porque hoje a mobilidade é totalmente diferente do tempo em que os seus pais emigraram.

Mais do que sentirem-se portugueses ou franceses, ou alemães, sentir-se-ão europeus.

O mesmo sentimento que terão muitos dos filhos dos ucranianos que chegaram ao nosso território no final dos anos 90 e início da década seguinte.

Crianças quando vieram, estão agora a frequentar o ensino superior e encaram Portugal como o seu lar. Mas não esquecem as origens. Mais uma vez, um coração, dois países.

Uma geração que não se prende a um mapa com fronteiras, como se percebe pelo trabalho que publicamos nesta edição, e que pretende aproveitar o melhor dos dois, ou mais, mundos.

Jovens com mais formação, como o são hoje quase todos, que não colocam de lado a possibilidade de sair de Portugal em busca de novas experiências pessoais e profissionais, deixando o País mais pobre. E mais envelhecido.

É sabido que o índice de envelhecimento (número de pessoas com 65 e mais anos por cada 100 pessoas menores de 15 anos) da população portuguesa se tem agravado, como mostram os dados da Pordata: era de 153,2% em 2017, contra os 27,5% de 1961.

A população mais velha não pode ser esquecida e há que promover políticas públicas orientadas para este segmento.

Muitas vezes isolados, os idosos passam a ter “uma vida pobre”, nas palavras de Joaquim Cândido, neurologista entrevistado nesta edição. Mais do que pobre em termos económicos, o que também se verifica em muitos casos, pobre de relações sociais e de afectos.

São por isso de louvar iniciativas como o Viver Melhor, que envolve vários parceiros em Leiria e faz com que os idosos do Bairro Sá Carneiro saiam de suas casas e convivam uns com os outros.

“Ter vida” é, segundo aquele especialista, a melhor forma de prevenir as demências.

Alerta que deve fazer-nos pensar e ajustar políticas públicas e respostas sociais, hoje muitas vezes ainda mais preocupadas em assegurar alojamento, alimentação, medicação e cuidados de higiene e menos em proporcionar-lhes vida.