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The Allstar Project regressam com novo tema para celebrar 20 anos

17 dez 2021 08:49

Momentum, lançado esta sexta-feira, é o primeiro tema da banda de Leiria em vários anos

A banda de Leiria com mais nomes artísticos em espanhol, que tem na biografia o interesse de um estúdio de Hollywood e a presença na camisola do SCL Marrazes, revelou esta sexta-feira, 17 de Dezembro, o motivo da contagem decrescente no regresso às redes sociais.

Um novo tema, o primeiro em vários anos, Momentum.

“Foi a maneira que encontrámos de ao fim de 20 anos celebrar e agradecer tudo o que partilhámos entre nós e com os outros. Na verdade talvez seja mais uma despedida”, adianta Nuno Filipe, um dos fundadores do colectivo The Allstar Project (TAP), que editaram o último álbum em 2011 e tocaram pela última vez ao vivo no Há Música na Cidade de 2015, no terraço de um edifício.

Já são duas décadas de um percurso começado quase por brincadeira por dois ex-Phase e dois ex-Sinclair, muitas vezes encarado como esforço secundário na carreira de cada um dos músicos envolvidos, porém, de modo quase unânime, visto como definidor do som made in Leiria, precursor do que acontece agora com as gerações mais novas abrigadas na Omnichord e referência inevitável na afirmação do concelho como território de cultura.

Da formação actual, o ex-Born a Lion Nuno Filipe (Nuñez) toca com Sean Riley & The Slowriders, tal como Filipe Rocha (Paco), que também colabora com Cabrita e The Legendary Tigerman; Tiago Veloso (Velásquez) e João Santos (Ramon) integram os Twin Transistors e Tiago Carvalho (Sawyer) acompanha David Fonseca.

Quando em 2001 os membros iniciais dos Allstar – Nuñez, Luís Mendes (Phill Mendrix), Paulo Fuentez e Hélder Ferreira (Che Riff) – se juntaram pela primeira vez para ensaiar nas instalações do Clube Desportivo Campos do Lis, tinham como “grande influência” os norte-americanos Mercury Rev, de Jonathan Donahue.

“Achámos que gostaríamos de fazer algo que estivesse no campo das banda sonoras”, explica Nuno Filipe. “E só soubemos mais tarde da existência desse tal subgénero que é o post rock, através de amigos”.

Continuam sem assinar uma banda sonora – apesar da cuidadosa e impressionante projecção de imagem nos espectáculos ao vivo – mas têm um lugar na história, precisamente, conotados com o post rock.

“Curiosamente, o impacto acabou por ser maior fora de Portugal. Lembro-me que foram tocar a um festival na Bélgica [em 2012, o Dunk!] e venderam em cinco minutos todos os CD's que levavam”, conta Pedro Vindeirinho, da editora que lançou os álbuns Your Reward... a Bullet (2007) e Into the Ivory Tower (2011), sucessores dos EP The Berlenga Connection (2003) e Something to do With Death (2006).

“A mim sempre me pareceu que podiam ter tido muito mais notoriedade do que tiveram”, considera o responsável pela Rastilho, para quem os Allstar são “uma banda de culto”.

A mesma opinião tem Pedro Miguel Ferreira, autor do livro Uma Cena ao Centro e doutorando na Universidade de Coimbra com uma investigação sobre a indústria da música. “Tinham todas as condições para serem grandes”, porque se apresentavam “a um nível muito alto”, no patamar “de bandas internacionais” como, por exemplo, os escoceses Mogway. “Só não vingaram, se calhar, porque eram portugueses e de Leiria”.

Da fama não se livram: independentes, avessos a concessões, obstinados com a estética, o conceito e a coerência.

“Sempre nos deu muito gozo discutir e incorporar ideias e narrativas que estavam fora do espectro musical sem nunca nos levarmos demasiado a sério, ainda que em tudo o que fazemos ou fizemos se encontrem de uma maneira ou outra, as nossas inquietações, a forma como nos vemos, no mundo e na vida”, resume Nuno Filipe, que arrisca uma selecção de melhores momentos dos últimos 20 anos: “No top trivia daquilo que as pessoas podem não saber e que ainda achamos incrível, está o orgulho que foram os dois anos em que tivemos o nosso nome na camisola da equipa principal do SCL e Marrazes, o de alguma forma termos contribuído para a nova vaga de bandas de Leiria e tudo aquilo que esteve quase para acontecer, como o interesse de um estúdio de Hollywood em ter uma das nossas músicas no trailer de um filme do Ben Stiller”.

Depois de alguns anos a ensaiar no Orfeão Velho (e a colaborar com O Nariz na programação) mudaram-se para casa de João Santos (Ramon) e montaram o estúdio TAP Headquarters, de onde saíram os primeiros discos da então embrionária Omnichord Records, actualmente com actividade centrada no espaço Serra, na Reixida, que é a editora que os acompanha na lançamento de Momemtum.

“De certa forma, a Omnichord e as suas bandas, algumas, não todas, aproveitaram as coisas boas que os Allstar deixam e continuaram o legado”, refere Pedro Vindeirinho, convicto que os TAP contribuíram para definir “um som leiriense”, suportado nas guitarras, “distintivo e especial”, um longo instrumental para “efeitos visuais” de natureza “cinematográfica” que à época pareciam “extremamente à frente” e hoje se ligam, por exemplo, pelo menos parcialmente, com a obra dos First Breath After Coma.

“Era impossível não ficarmos tocados porque eram concertos marcantes”, diz o dono da Rastilho. “Tudo o que faziam era muito pensado. A banda era encarada como um side project mas tudo o que faziam era extremamente profissional”.

Pedro Miguel, que chegou a participar num videoclipe dos TAP, sublinha as “paisagens sonoras” imaginadas e materializadas por músicos “muito bons”, que até começaram com o pé esquerdo, num primeiro concerto, no Pedrógão, que considera “horroroso”. Daí em diante, no entanto, foi sempre a subir. “Eu trabalhava com o Rui Horta e levava a música deles para andar de carro. É uma maravilha”.

Depois de Into the Ivory Tower (2011), depois de Abadeth (part II) incluído na colectânea Leiria Calling (2014), depois do grandioso concerto de 2015 no Há Música na Cidade, esta sexta-feira prossegue a epopeia dos Allstar. Como sempre, preparada com todos os detalhes. E com hora marcada: a primeira hora do novo dia.