Sociedade

Stephens, 250 anos de uma marca indelével na Marinha Grande

12 set 2019 00:00

Há uma herança arquitectónica, social e cultural que um ilustre inglês deixou na cidade

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Daniela Franco Sousa

Muito do que a Marinha Grande é hoje, enquanto cidade altamente industrializada, deve-se à presença de Guilherme Stephens, o inglês que chegou há 250 anos para injectar resiliência e perspicácia no ADN das gentes daquele território. Mas o contributo de Guilherme Stephens extrapolou a capacidade de empreender que imprimiu na Marinha Grande. Além da fábrica de vidro, o inglês promoveu o ensino, a música, o teatro e deixou um património arquitectónico que ainda hoje é possível admirar. O JORNAL DE LEIRIA foi ao encontro do legado que persiste.

A chegada de Guilherme Stephens à Marinha Grande, em 1769, está associada à reactivação da Real Fábrica de Vidros, uma missão que lhe fora confiada pelo próprio Rei D. José I. Transferida de Coina para a Marinha Grande, a Real Fábrica de Vidros tinha falido e foi graças aos esforços de Guilherme Stephens que aquela indústria voltou a pulsar.

Guilherme Stephens reedifica a fábrica dos vidros mandando construir dois novos edifícios onde seriam instalados os fornos e demais equipamentos para o fabrico da vidraça - local onde hoje se encontra instalada a Biblioteca Municipal da Marinha Grande – e para o fabrico do vidro comum/cristal – local onde hoje se encontra instalada a Escola Profissional e Artística da Marinha Grande.

Inaugurada a 30 de Novembro de 2001, a Biblioteca Municipal está situada em pleno centro da cidade da Marinha Grande, instalada entre os outros espaços pertencentes ao conjunto edificado da antiga fábrica. Desde a sua inauguração, a Marinha Grande passou a integrar a Rede Nacional de Bibliotecas Públicas, tendo recebido todo o espólio documental pertencente à Biblioteca Fixa da Fundação Calouste Gulbenkian existente na cidade. Constitui-se como um pólo de acesso à cultura, à informação, à educação e ao lazer, de utilização livre e aberta a todos.

Já a Escola Profissional e Artística da Marinha Grande foi criada a 8 de Julho de 1991 e iniciou as suas funções em Outubro do mesmo ano. Nessa altura, teve como principal objectivo dar resposta às necessidades de forformação de técnicos intermédios nas áreas de Decoração de Vidro, Gestão, Electrónica e Turismo, sectores que se encontravam em franco desenvolvimento no contexto regional.

A Guilherme Stephens se deve também a edificação de um palacete com três pisos, usado para sua residência, onde este recebeu ilustres convidados, de entre os quais a Rainha D. Maria I. É neste local que se encontra hoje instalado o Museu do Vidro.

Constituído há duas décadas, o Museu do Vidro é actualmente um dos locais mais visitados da cidade. De acordo com a Câmara Municipal da Marinha Grande, quem conhece este espaço museológico fica rendido às peças do século XVIII (como as galhetas unidas), também pela garrafa de seis vinhos, pelo lustre do salão nobre, pelas ventosas (e pela sala do vidro de farmácia no seu todo) ou até mesmo pelos moldes“A sala do vidro doublé é das que suscita também muito interesse, pelas cores do vidro e pelo trabalho de decoração das peças (lapidação e gravação)”, salienta o Município.

Outra obra da responsabilidade de Guilherme Stephens foi a construção do teatro, onde todos os domingos os trabalhadores interpretavam peças. O edifício acabaria mais tarde por ser destruído pelas tropas napoleónicas durante as terceiras invasões francesas, mas no local está actualmente instalada a Casa da Cultura - Teatro Stephens.

Após um investimento superior a dois milhões de euros na requalificação do equipamento, financiado em 85% por fundos comunitários, o espaço reabriu dia 25 de Outubro de 2016.

Guilherme Stephens mandou construir ainda outras dependências, oficinas e edifícios ao longo da área actualmente murada, a que corresponde o núcleo do Património Stephens mais antigo e as antigas instalações da Fábrica Escola Irmãos Stephens, onde hoje estão instalados outros equipamentos, como a Galeria Municipal, as oficinas e Serviços Educativos do Museu do Vidro, uma loja para promoção de produtos locais e uma cafetaria.

Dentro do património Stephens foi ainda construído de raiz um edifico que alberga actualmente o Arquivo Municipal da Marinha Grande.

Guilherme Stephens promoveu tambémdiversas inovações na agricultura, reservando os terrenos onde hoje se encontra o Parque da Cerca, entre outros, para o cultivo da terra e o desenvolvimento técnicas e práticas agrícolas.

A sua obra social foi ímpar: criou uma escola para os seus operários, principalmente os mais novos, receberem educação; construiu um posto de primeiros socorros onde eram tratados gratuitamente os trabalhadores doentes ou feridos; organizou um fundo de ajuda para doenças; criou um plano de pensões e pagava bons salários.

Guilherme Stephens faleceu em 5 de Maio de 1803 na sua casa em Lisboa, cinco dias antes do seu 72.º aniversário. No seu testamento, nomeou o seu irmão mais novo, João Diogo Stephens, como seu único herdeiro.

Guilherme Stephens montou uma moderna fábrica de vidros, que produziu vidraça e vidro utilitário/decorativo de grande qualidade. Tinha a trabalhar consigo mestres estrangeiros e aprendizes portugueses. A sua actividade não se limitou apenas ao desenvolvimento da fábrica. A iniciativa de Guilherme Stephens repercutiu-se na formação dos seus trabalhadores, na criação e manutenção de certas estruturas que foram essenciais ao desenvolvimento da Marinha Grande, principalmente vias de comunicação.

Após a sua morte a fábrica passou a ser administrada pelo seu irmão, João Diogo Stephens.

Recentemente, em Dezembro de 2018, a Autarquia adquiriu as instalações da Fábrica Escola Irmãos Stephens por 1.2 milhões de euros. “Havendo várias ideias na forja para este espaço, a Câmara Municipal deseja apresentar brevemente as suas ideias de recuperação do espaço para que estas sejam alvo de um processo de debate público”, adianta a presidente da Autarquia, Cidália Ferreira.

Inglês deu nova vida
à Real Fábrica de Vidros

Em 1719 é instalada na margem esquerda do Rio Tejo, na proximidade da Aldeia Galega, em Coina, a Real Fábrica de Vidros de Coina, que produzia vidro de qualidade para vários tipos de uso, desde garrafas ao vidro doméstico. Utilizava vários processos de decor

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