Economia

Recursos financeiros disponíveis “são imensos”, mas têm de ser bem investidos

11 mai 2021 22:25

Presente na conferência “Desenvolvimento da Região de Leiria - Acções Estratégicas 2030”, que teve lugar hoje em Leiria, coordenador do Plano de Recuperação e Resiliência alertou para a necessidade de Portugal aplicar “de forma produtiva” os fundos de que vai dispor

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Costa e Silva: trabalho feito pelo GESRL “é um espelho do que precisamos fazer em todo o País”
Ricardo Graça
Raquel de Sousa Silva

Portugal vai ter à sua disposição muitos milhares de milhões de euros nos próximos anos, mas tem de conseguir aplicar estas verbas “de forma produtiva”.

O alerta é de António Costa e Silva, coordenador do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), que esta tarde participou em Leiria numa conferência organizada pelo Gabinete Económico e Social da Região de Leiria (GESRL) para anunciar as suas propostas de acções estratégicas para o desenvolvimento da região na próxima década.

Referindo-se aos programas de que o País vai dispor, Costa e Silva afirmou que “os recursos são imensos”, mas lembrou que “temos a tradição” de nem sempre empregar bem estes fundos. Os que aí vêm “têm de ser investidos de forma produtiva para catalizar e desenvolver o País, através de todos os seus territórios”.

Mas tal “só é possível se mudarmos a maneira de fazer as coisas”, disse o coordenador do PRR, para quem é necessária igualmente uma “grande reforma de mentalidades”. É que somos um povo “muito individualista”, com pessoas muitas vezes “encerradas nos seus silos” e embrenhadas em “guerras de alecrim e manjerona”.

Para conseguirmos ultrapassar os impactos da pandemia, é preciso um “grande projecto de mobilização nacional”. Mas Costa e Silva acredita na capacidade de resiliência do País. “Somos uma nação resiliente, que já resistiu a inúmeras crises, e que vai resistir a esta e superá-la”.

Frisando que a economia está estagnada, destacou que só conseguirá crescer se mexer nas alavancas que podem criar condições para o crescimento do Produto Interno Bruto nos próximos anos.

E que alavancas são essas? “Algumas delas estão contempladas no programa apresentado para Leiria”: a aposta nas competências e nas qualificações é uma delas. O investimento nesta área “é absolutamente decisivo para o futuro”.

A digitalização, contemplada também no programa de desenvolvimento apresentado pelo GESRL, é igualmente fulcral. “Há na região indústrias consolidadas que podem ser apoiadas por estes processos de digitalização para transformarem a fabricação de produtos e competirem no mercado global”, entende Costa e Silva.

Outros aspectos contemplados no programa de Leiria, “e que são muito importantes”, prendem-se, por exemplo, com a reconversão industrial. “No auge da crise, a Europa acordou para a sua enorme dependência em muitas das cadeias logísticas e de produtos fabricados na Ásia”.

Costa e Silva acredita que temos competências - na área da síntese de química fina e da criação de substâncias activas, por exemplo - para transformar o nosso País “numa espécie de fábrica de  medicamentos da Europa”.

O que falta para que tal aconteça? “Políticas públicas que sejam capazes de coligar todas estas competências e transformá-las no motor de desenvolvimento do País para o futuro”.

Costa e Silva tinha começado a sua intervenção salientando que o País não pode falhar esta oportunidade de executar as mudanças necessárias e dizendo que o trabalho que tem sido feito pelo GESRL “é um espelho do que precisamos fazer em todo o País”.

Ou seja, falar uns com os outros, “sair das torres de marfim”, dialogar e mobilizar todos os actores, das autarquias às empresas, passando pelo sistema científico e tecnológico. “Se não o fizermos, vamos falhar esta grande oportunidade que temos à nossa frente”.

Da digitalização à saúde, oito áreas de intervenção essenciais

O programa de desenvolvimento da região de Leiria apresentado na conferência desta tarde assenta em oito áreas de intervenção essenciais: digitalização de produtos, processos e organizações; reindustrialização e reconversão industrial; capacitação em gestão e técnicas específicas; promoção da mobilidade nas cidades, intercidades e na região; investigação, desenvolvimento e inovação aplicada; descarbonização, eficiência energética e economia circular transversal; e-commerce, cadeias logísticas e promoção da internacionalização e da produção exportadora; saúde e desenvolvimento social.

“É nosso entendimento que este programa tem um ponto positivo, e mesmo pouco usual, uma vez que faz propostas de clarificação e explicitação daquilo que pode ser a ambição da região”, explicou José Morais, coordenador técnico do plano.

Antes ainda, já Isabel Damasceno, presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro (CCDRC), tinha dito que se encontra no programa uma “análise fina” daquilo que deve ser melhorado numa região que já tem muito de bom.

O programa com as propostas de acções estratégicas “é um documento muito rico, que deve ser muito bem acarinhado por todos”. Agora, definidas as áreas estratégicas, é preciso selecionar as acções prioritárias, porque “não será possível fazer tudo ao mesmo tempo”.

Isabel Damasceno revelou que o Portugal 2030 terá uma dotação total de 33,6 mil milhões de euros, e lembrou que o País vai ainda dispor do PRR, com 14 mil milhões de euros a fundo perdido e mais 2,7 mil milhões de empréstimos.

Este último instrumento “é de uma exigência brutal” no que toca ao cumprimento de prazos, pelo que é preciso que os agentes consigam apresentar projectos “maduros” e “fazer o trabalho de casa” de forma a que a sua execução decorra da melhor forma e não haja penalizações.

A presidente da CCDRC voltaria a falar no tema noutro momento da conferência: com as exigências de Bruxelas, “colocar os ministérios a executar projectos [em sede de PRR] não vai resultar”. “Felizmente, há a noção clara da parte do governo da vantagem da territorialização”.

Gonçalo Lopes, presidente da Comunidade Intermunicipal da Região de Leiria, afirmou que o programa de desenvolvimento apresentado “não é propriamente uma carta ao Pai Natal”. As acções que contempla “estão bem alinhadas e representam a ambição dos vários actores do território”.

“O plano estratégico do hospital, e a sua ambição para o futuro, está reflectido numa das acções”, disse Gonçalo Lopes, que considerou ainda fundamental melhorar a rede de centros de saúde.

“Separados somos fracos. Seremos muito fortes se pensarmos em grande e em conjunto. E se a máquina funcionar toda, bem oleada, vamos ter resultados evidentes na próxima década. Só iremos ter constrangimentos se a nossa ambição for limitada pela nossa visão do futuro e se não acreditarmos na nossa força de trabalhar em equipa”, disse o presidente da CIMRL.

António Poças referiu que deste plano para o desenvolvimento de Leiria resultam 70 medidas, tendo destacado algumas das que mais têm a ver com as empresas. Falou nomeadamente na digitalização, lembrando que “não é uma questão técnica, mas comportamental e de literacia digital”.

O presidente da Nerlei mencionou também a reindustrialização, lembrando a “forte tradição” industrial da região e considerando que “temos de aproveitar esta oportunidade para alavancar a nossa indústria e avançar para áreas que reforcem a componente exportadora”.

O dirigente frisou ainda a necessidade de reforçar a qualificação e a requalificação das pessoas, “porque as novas formas de produzir vão exigir novas competências”. E destacou a importância de serem criados mecanismos para capitalizar as empresas.

“A região deve ter capacidade para intervir mais fortemente nesta área, não ficando refém de estratégias nacionais que muitas vezes não nos são favoráveis. Por isso, este plano também tem um projecto muito ambicioso de criação de um fundo regional”, explicou António Poças.

Para Rui Pedrosa, presidente do Politécnico de Leiria, a pandemia “veio demonstrar a importância das redes colaborativas” e o trabalho feito no âmbito do GESRL no último ano “é sinal de que a região está preparada para os desafios do século XXI”.

Destacou três dimensões que devem ser prioritárias. Uma delas passa por, em conjunto com as autoridades de saúde, e em particular com o Centro Hospitalar de Leiria, encontrar condições para criar um laboratório avançado de diagnóstico e vigilância epidemiológica.

Outra é a criação de um centro de formação “forte”, de âmbito distrital, em parceria com o Instituto de Emprego e Formação Profissional de Leiria.

Mas a mais importante, para Rui Pedrosa, seria um investimento directo na construção de uma nova Escola Superior de Educação e Ciências Sociais, entidade que “forma quem vai formar os cidadãos do futuro e que não tem as condições que merece”.