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Rafael Almeida, realizador: “Prefiro abordar o realismo no documentário”

9 mai 2021 12:00

Cineasta lançou campanha de crowdfunding para a websérie "Caligem", que escreveu durante o confinamento

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Rafael Almeida
DR
Jacinto Silva Duro

Lançou recentemente, em http://caligem.pt, uma angariação de fundos para financiar o projecto de criação de uma websérie. Como está a correr a campanha?
Caligem é a primeira coisa que faço dentro da ficção científica, apesar de isso estar um pouco escondido no primeiro episódio, que já está disponível. O género ficará mais evidente nos próximos capítulos. É também uma primeira incursão no tema do pós-apocalíptico, que sempre me interessou abordar, mas que ainda não tinha tido a oportunidade de o fazer. Não me identifico muito com o cinema realista, gosto mais do tema do fantástico.

Qual é o tema central da série?
Sem revelar muito, tudo começa com uma tempestade que ameaça a sobrevivência da espécie humana, naquele universo do filme. No primeiro episódio, ficamos a saber que há uma personagem, a quem o actor João Sério dá corpo, que recolhe os cadáveres de quem morre nesse evento cataclismo. De cada vez que uma nova tempestade acontece, os habitantes deste mundo têm de se refugiar em bunkers, que pertencem a uma entidade que regula aquele mundo. Para garantir a continuidade da espécie, é necessário sacrificar algo, ou alguém. Neste primeiro episódio, acompanhamos um homem, que recolhe os cadáveres de quem morre nas tempestades. Mas, desta vez, a causa da morte parece ter sido outra...

São cinco episódios, de quantos minutos, cada?
São cinco episódios de cinco minutos, cada um. A websérie vai ter um total de 25 minutos. Serão lançados, uma vez por semana, através do Youtube e de algumas plataformas de video-on-demand, após a conclusão das filmagens e da edição.

Quando pretende fazer as filmagens?
Acredito que acontecerão entre Julho e Setembro. Após isso, gostaria que os episódios saíssem no final do ano ou no início de 2022. Alguns terão ainda bastante trabalho de pós-produção, em termos de efeitos especiais, e isso fará com que a data de lançamento possa acontecer só no início do ano que vem.

"Caligem começa com uma tempestade que ameaça a sobrevivência da espécie humana. No primeiro episódio, ficamos a saber que há uma personagem, que recolhe os cadáveres de quem morre nesse evento cataclismo"
Rafael Almeida

Como aconteceu o encontro entre si, o realizador, e o actor principal, o João Sério?
A minha jornada no Cinema começou com ele, quando, em 2014, realizei o Dementia. Era um trabalho para a cadeira de Cinema Experimental, na universidade, e que acabou por ser mais do que isso. Apresentei essa curta, que resultou de uma noite de filmagens, sem guião, na Ubi, e depois ela entrou no circuito dos festivais e chegou ao MoteLX, após passar por 30 certames diferentes. Depois disso, voltei a trabalhar com o João Sério em No que é feito dos dias na cave? e no Igor, com que venci os Prémios Sophia. O meu percurso tem estado ligado a ele.

Quando escreve, já é com ele na ideia?
A ideia... quando tive a ideia-base, por exemplo, para a Caligem, reuni-me com ele e com as assistentes de produção Cláudia Mendes e Ingra Barreto e começámos a fazer uma mesa de guionistas, onde escrevemos o guião a partir das ideias de cada um. Depois, escrevi os cinco episódios que, após isso, enviei a amigos meus guionistas, de Portugal e do Brasil, pois estou a tentar o lançamento da websérie nesse país, noutras plataformas. Foi um guião que envolveu muita discussão e foi muito pensado, de forma a gerar outros tipos de interesse, para lá da ficção científica.

Precisa de três mil euros para terminar o projecto.
É o valor mínimo para realizar e terminar os quatro episódios que faltam. Se conseguirmos valores acima disso, conseguiremos melhorar a produção. O dinheiro será para o aluguer do material, alimentação da equipa, transportes... É o mínimo e espero que consigamos alcançar o objectivo. O primeiro episódio foi produzido com o dinheiro do nosso bolso, para podermos mostrar às pessoas o que queremos fazer [https://ppl.pt/caligem] e gerar interesse.

Os anos de 2020 e de 2021, para o cinema, são de quase paragem?
Na verdade, poderemos ter aqui um paradoxo. Como tive menos trabalho em eventos e publicidade, ou seja, no trabalho que me sustenta, acabei por ter mais tempo para me dedicar ao cinema, que era algo que já não tinha há anos. Estive parado, mas permitiu-me pensar em novas coisas. Agora tenho vários projectos para os quais quero apresentar candidaturas.

Fazer cinema que não seja fantástico, está nos seus planos?
Sinto-me mais virado para o documentário do que para o cinema de ficção não fantástico. Prefiro abordar o realismo no documentário. No ano passado, estive envolvido num projecto documental em Penela e gostei da experiência. Na ficção, quando é uma história realista, que não envolva o mínimo de fantasia, não me gera tanto interesse. Na verdade, há muita gente, muito boa, a abordar esse género.

No documental, troca o guião pela investigação?
Tenho de fazer muita investigação para poder fazer fantásticos. De qualquer modo, agora, tenho em mãos um projecto documental sobre lendas do folclore português e terei alguma investigação para fazer, que depois será tornada fantástica. É uma fantasia que tem investigação como base e não como algo a seguir fielmente.

Perfil
Prémio Sophia, em Ficção

Rafael Almeida nasceu há 27 anos em Figueiró dos Vinhos. Viveu e estudou na vila, até que partiu para a Covilhã onde se formou em Cinema na Universidade da Beira Interior.
 
Ainda durante o curso começou a dar nas vistas com as suas curtas-metragens, até que, no início deste ano, venceu o Prémio Sophia, o "Óscar português" da Academia Portuguesa de Cinema, em Ficção, na categoria Estudante, com a curta-metragem Igor.
 
É também autor dos premiados filmes Que é feito dos dias na cave? e Demência.
 
Assinou igualmente, ao longo da sua curta, embora profícua carreira, vários anúncios, documentários e live events.
 
Em 2020, a pandemia surpreendeu-o a meio do mestrado na Universidade da Beira Interior, mas congelou a matrícula.
 
"No final desse ciclo de estudos, ia fazer um filme, mas não o quis fazer neste contexto", conta.
 
Regressou a Figueiró dos Vinhos e aproveitou o tempo para organizar as ideias e escrever novos guiões.
 
Foi o caso da websérie Caligem, para a qual procura agora apoio financeiro, e de outras curtas metragens que se encontra a desenvolver com outros cineastas.