Sociedade

Pedrógão Grande: "Conheço casas devolutas já construídas. Isto é de lamentar"

11 set 2018 00:00

Assembleia municipal extraordinária terminou como começou: com dúvidas por esclarecer.

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Assembleia municipal em Pedrógão Grande, sessão extraordinária para analisar a distribuição de donativos, depois do incêndio de 2017, com a oposição PSD a aproveitar para reiterar as denúncias de imóveis reconstruídos indevidamente através do fundo Revita. 

José Henriques, presidente da Junta de Freguesia de Vila Facaia eleito pelo PSD, mostrou-se disponível para ir ao terreno identificar casos que alegadamente não cumprem as regras: "Tenho na minha freguesia cinco famílias de casas de primeira habitação que ainda não estão a viver nelas e conheço casas devolutas já construídas. Isto é de lamentar".

As suspeitas relacionam-se com segundas habitações e imóveis devolutos que, de acordo com reportagens da revista Visão e da televisão TVI divulgadas nas últimas semanas, beneficiaram das ajudas à reconstrução canalizadas para Pedrógão Grande, no âmbito do Revita, quando a prioridade eram as primeiras habitações, ou seja, as habitações permanentes.

"Como é que barracões passam a primeira ou segunda habitação sem sequer serem merecedores enquanto temos idosos que ainda não têm nada, nem um saco de cimento", questionou Vasco Esquina, um jovem de 18 anos, de Pedrógão Grande, durante o período aberto a intervenções e perguntas do público.

Logo no arranque da assembleia municipal extraordinária, que decorreu ontem, segunda-feira, na Casa Municipal da Cultura, entre as 17 e as 21 horas, com quase 200 pessoas presentes, muitas delas em pé, o presidente da Câmara de Pedrógão Grande, Valdemar Alves, garantiu que "não foi reconstruída nenhuma casa que não tivesse ardido".

Eleito nas listas do PS, o autarca assegura que "todas as primeiras habitações afectadas estão já reconstruídas ou em fase final de reconstrução". Valdemar Alves acrescenta que "o fundo Revita não deu directamente a ninguém dinheiro para reconstruir casas" e que todas as verbas "foram libertadas à exacta medida em que iam sendo executadas as obras", mediante um contrato assinado entre as famílias e as empresas construtoras.

Aos jornalistas, Valdemar Alves reforçou que "não houve administração nenhuma de dinheiros por parte da Câmara na reconstrução" e negou a existência de irregularidades: "Não há. As coisas que se fizeram são habitações de primeira [habitação]. E foram habitações que arderam".

Quanto ao preenchimento dos documentos e validação do processo, com o carimbo do Município, o presidente da Câmara de Pedrógão Grande reconhece que pode haver falhas "na entrega ou não de um documento ou problemas com o número de contribuinte", mas nega um cenário de desvio de fundos para casas não prioritárias.

Nas situações em que os serviços camarários aceitaram facturas de electricidade de um vizinho, Valdemar Alves responde com a necessidade de acudir aos problemas sociais no concelho de Pedrógão Grande.

Sobre os exemplos sinalizados nas reportagens, Valdemar Alves reconhece que não voltou a consultar os processos, mas, ainda assim, nega qualquer incumprimento. "Não consultei processos nenhuns, são aqueles que assinei, foram para o Revita e confio nas pessoas que elaboraram os processos. Confio nos funcionários e confio também nas pessoas que assinaram as suas declarações de honra".

Entre as fileiras da oposição, os sociais-democratas na assembleia municipal rejeitaram a ideia de que algum elemento do PS na Câmara de Pedrógão Grande tenha desviado fundos. Mas mantiveram as críticas. "Não acredito que este executivo desviasse um cêntimo, agora que tentou reconstruir casas, está mais do que provado que sim", disse o independente eleito pelo PSD Luís Paulo Fernandes, com um apelo à transparência.

Na bancada do PS, Luís David deixou um apelo à calma: "Estamos à espera que a Justiça se pronuncie". E acrescentou: "Tem tanto culpa este executivo como o anterior (...) E o que é hoje oposição era quem estava lá. E isto não se iniciou agora".

A distribuição de dinheiro para a reconstrução de habitações permanentes depois do incêndio de 2017 com início em Escalos Fundeiros, Pedrógão Grande, está já sob investigação do Ministério Público e também sob escrutínio da comissão técnica do Revita, fundo que recebeu donativos dos portugueses e de instituições públicas e privadas.

Em Pedrógão Grande e nos concelhos vizinhos foram identificados 261 imóveis de habitação permanente. Em Julho, cerca de 100 continuavam por entregar às famílias, indica o mais recente relatório de execução.