Opinião

Entre a bolha e a diversidade

1 fev 2018 00:00

Numa época em que as chamadas soft skills ganham cada vez maior importância no mundo profissional, a opção por um percurso escolar reservado e, consequentemente, socialmente limitado, poderá não ser a melhor.

É conhecida a tendência de muitas famílias com capacidade económica em colocar os seus filhos em instituições de ensino privadas, onde procuram mais segurança, maior acompanhamento, mas também um ambiente reservado e controlado, longe das crianças e jovens das classes mais desfavorecidas que, coincidem muitas vezes com as mais problemáticas.

Tentam, assim, manter os seus filhos numa bolha, afastados dos problemas da sociedade e inseridos num grupo restrito, grupo esse que fará um dia parte da elite da sociedade portuguesa, aproveitando o networking conseguido ao longo do percurso escolar para os seus negócios e profissões.

É sem surpresa, portanto, que muitas das personalidades de maior relevo nas diferentes áreas da nossa sociedade sejam amigos de longa data por terem estudado juntas, seja no S. João de Brito, nos Salesianos, na Nossa Senhora do Rosário, ou num outro qualquer colégio que geralmente ocupa um dos lugares cimeiros dos rankings, estabelecimentos de onde têm saído, por exemplo, a maioria dos CEO das principais empresas, muitos dos advogados de maior í, vários ministros e embaixadores, entre outros cargos onde assenta boa parte do poder em Portugal.

Como em tantas outras coisas, essa tendência chegou a outras cidades do País, onde as elites locais adoptaram os modelos do Porto e de Lisboa, sendo que, como é óbvio, o nível de networking alcançado é proporcional à quantidade e relevância das famílias com influência. No entanto, numa época em que as chamadas soft skills ganham cada vez maior importância no mundo profissional, nomeadamente as habilidades sociais e de comunicação, onde as emoções e as intuições são determinantes, a opção por um percurso escolar reservado e, consequentemente, socialmente limitado, poderá não ser a melhor.

No fundo, a questão que as famílias se devem colocar é se o melhor para o futuro dos seus filhos é oferecer-lhes um ambiente escolar homogéneo e artificial, onde lidam apenas com pares com os mesmos interesses, influências idênticas e formas de pensar e de estar pouco díspares, ou se, pelo contrário, seria mais benéfico serem desde cedo confrontados com a diversidade, com situações a que não estão habituados, com conflitos e tensões, com tudo aquilo o que é o espelho da sociedade na qual vão um dia ser adultos e exercer uma profissão.

Vem esta reflexão a propósito do trabalho que o JORNAL DE LEIRIA apresenta nesta edição sobre a Escola do Arrabalde, uma instituição do 1.º ciclo localizada em Leiria onde mais de um terço dos alunos são imigrantes, oriundos de 12 países distintos, além de ter também uma elevada percentagem de alunos de estratos sociais mais baixos, que inclui os filhos dos feirantes que ali estudam durante a Feira de Maio.

Apesar de ser uma escola algo estigmatizada por preconceitos que ainda abundam em muitas cabeças, a verdade é que a Escola do Arrabalde é, provavelmente, a que em Leiria tem um ambiente mais rico e que proporciona experiências capazes de melhor desenvolver as tais soft skills.

*Director