Sociedade

Câmara de Pombal: “Incumprimento” diz o presidente; “Motivações pessoais”, responde a vereadora e a oposição

3 abr 2020 09:30

Versões diferentes para explicar a avocação de pelouros feita pelo presidente do Município de Pombal.

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Vereadora desde 2009, Ana Gonçalves viu agora o presidente retirar-lhe os pelouros
Ricardo Graça
Maria Anabela Silva

Com o País e o concelho mergulhados na crise provocada pelo Covid-19, acabou por ser a retirada de pelouros à vereadora Ana Gonçalves por parte do presidente, a dominar grande parte da última reunião de Câmara de Pombal, a primeira realizada depois da decisão. O assunto foi debatido durante cerca de três horas, com a apresentação de versões divergentes.

O presidente da Câmara apontou como causa o “incumprimento” de funções e “quebra de confiança” por parte de Ana Gonçalves, nomeadamente o facto de esta não ter dado seguimento a um despacho seu. A vereadora acusou Diogo Mateus de “faltar à verdade” e alegou que a decisão teve apenas que ver com “motivações estritamente pessoais”.

A versão da vereadora foi subscrita por elementos da oposição e por Pedro Brilhante, eleito pelo PSD e que, há meses, viu também o presidente retirar-lhe os pelouros. Foram, aliás, dele que se ouviram algumas das expressões mais fortes para atacar a recente decisão do líder do município, acusando-o de estar a fazer “uma canalhice” e de ser “uma pessoa moralmente corrompida”.

Da parte dos vereadores sem pelouro vieram também muitas críticas ao momento escolhido por Diogo Mateus para fazer a avocação dos pelouros e para a suspensão do director do Departamento de Recursos Humanos. “Absolutamente inoportuno”, considerou Odete Alves(PS), uma “grande falta de oportunidade”, disse Micäel António (NMPH), e uma “irresponsabilidade”, acrescentou Pedro Brilhante.

“Há decisões que só fazem sentido no tempo devido. Têm de ser tomadas no tempo certo. Não vou ceder ao mais cómodo nem optar pelo caminho mais simples”, argumentou o presidente da Câmara. Sobre as motivações da retirada dos pelouros a Ana Gonçalves, Diogo Mateus alegou que a decisão está relacionada com o processo de acumulação de funções de funcionários da Câmara.

Na versão que apresentou, há cerca de um ano incumbiu a vereadora de fazer uma reapreciação de todas as autorizações concedidas para essa acumulação, dando-lhe um prazo de 90 dias, findo o qual “todas” cessariam se ainda não houvesse decisão. Ora, segundo Diogo Mateus, a vereadora não só não fez esse trabalho como “alterou os termos do despacho”, dando-lhe uma interpretação “contrária”. Ana Gonçalves refutou a versão do presidente, acusando-o de “faltar à verdade”.

Nas explicações que apresentou, a vereadora reafirmou como “correcta” a interpretação que fez do despacho, referindo existir um parecer do gabinete de advogados avençado com a Câmara com a mesma leitura. Disse ainda que o caso da acumulação de funções do director de Departamento de Recursos Humanos, que, segundo o presidente, foi a gota de água que fez transbordar o copo, era do conhecimento de Diogo Mateus e que este não só “nunca decidiu” como, em determinado momento, a informou de que este “era um caso seu”.

“Sabe bem que avocou os pelouros por motivações estritamente pessoais, porque não cedi a pressões para renunciar ao mandato. E não cedi porque não havia nenhuma razão válida”, afirmou a vereadora, revelando que a família foi alvo de “ameaças” para que deixasse o executivo, sem especificar quem as fez.

“Dono disto tudo”

Depois de ouvir as duas versões, Odete Alves (PS) considerou “altamente forçado” o facto apresentado pelo presidente para justificar a avocação de pelouros e subscreveu a tese de que se “tratará de uma questão pessoal posta à frente do interesse público”. A socialista advertiu ainda para a situação de “instabilidade política” na Câmara, lembrando a Diogo Mateus que está agora em minoria.

Em resposta, o presidente do Município disse não haver motivos para falar em crise política, manifestando-se convicto que será possível “encontrar pontes” e que os vereadores do PSD a quem retirou pelouros não passarão a votar contra “o seu programa eleitoral só porque deixaram de receber ordenado”.

A vereadora do PS acusou ainda o presidente de se comportar “como se fosse o dono disto tudo” e de “estar a destruir um dos maiores activos da Câmara, os recursos humanos”, “fazendo saneamentos” e “perseguindo gente sem pensar nas consequências”. Uma acusação subscrita por Pedro Brilhante, que classificou a decisão de retirar os pelouros a Ana Gonçalves de “um delírio” e “uma canalhice”.

Micäel António e Pedro Brilhante falaram também em “motivações pessoais” para o afastamento da vereadora. “São motivos pessoais aqueles que o separam da vereadora. Os comentários surgem do seu círculo mais próximo. Da minha parte, não faço juízos de valor de reserva da intimidade das pessoas”, disse Micäel António.

Por seu lado, Narciso Mota (PH) limitou-se a pedir a Diogo Mateus que, “logo que seja possível”, devolva os pelouros aos dois vereadores do PSD. “Com este senhor não há condições para voltar a trabalhar na Câmara Municipal de Pombal”, respondeu Pedro Brilhante.