Editorial

Sozinhos em casa

19 jun 2025 08:01

Corre-se o risco dos centros históricos se tornarem “guetos” de curta duração, onde a falta de diversidade habitacional perpetua micro-universos isolados

A requalificação dos centros históricos, como a que se observa em Leiria, tem vindo a ser marcada por uma aposta cada vez maior em tipologias habitacionais pequenas — estúdios, T0 e T1 — destinadas sobretudo a estudantes, jovens profissionais e arrendamento de curta duração.

Justificada pelos promotores com o menor investimento inicial e maior facilidade de rentabilização, esta tendência pode imprimir mais dinâmica ao comércio local e fazer aumentar a presença de residentes, mas está a afastar as famílias e a promover uma rotatividade elevada de moradores, com consequências profundas para a coesão social, a identidade comunitária e territorial.

Segundo os especialistas ouvidos pelo JORNAL DE LEIRIA, corre-se o risco destes centros históricos se tornarem “guetos” de curta duração, onde a falta de diversidade habitacional perpetua micro-universos isolados, dificultando a adaptação mútua e a criação de laços de vizinhança.

Neste desenho do futuro dos centros urbanos, é fundamental a intervenção autárquica, de forma a planear, regular e equilibrar. Como defende o arquitecto João Serejo, “as cidades não podem estar apenas nas mãos dos interesses dos construtores”. Ou seja, cabe também às câmaras municipais a definição de estratégias de longo prazo, que vão além das tendências de mercado, assegurem o equilíbrio entre diferentes tipologias habitacionais e promovam a inclusão de famílias, jovens, idosos e outros perfis de residentes.

Se quisermos pensar as cidades não apenas no imediato mas num horizonte temporal de 15 ou 20 anos, é imprescindível que as autarquias estabeleçam critérios urbanísticos e regulamentos que incentivem a diversidade tipológica, colaborem com cooperativas e entidades do sector social para criar habitação acessível a famílias, e desenvolvam projectos que garantam a sustentabilidade social e económica dos seus centros, como admite o vereador da Câmara Municipal de Leiria com o pelouro das Obras, Ricardo Santos. Assim seja, senhor vereador, e que os seus pares o ouçam.