Editorial

“Pântano político” 

9 nov 2023 08:01

Passaram duas décadas e o País parece nunca ter saído do “pântano” a que Guterres alegadamente se referia

A expressão ficou para a história, há 22 anos, pela voz do então primeiro- -ministro, António Guterres. O Partido Socialista acabava de sofrer uma pesada derrota nas eleições autárquicas de 2001 e o governante, surpreendendo tudo e todos, anunciou que se demitia, para evitar que o País caísse num “pântano político, que minaria as relações de confiança entre governantes e governados”.

Que se saiba, Guterres nunca explicou em concreto o que queria dizer com a definição de “pântano político”. Mas João Cravinho, antigo ministro do Equipamento, Planeamento e Administração do Território, veio mais tarde alvitrar que a demissão não se deveu ao resultado das autárquicas mas ao “clima pestilento” de corrupção que existia em Portugal. “Só podia ser sobre corrupção que disse o que disse”, afirmou Cravinho, à época responsável pela sindicância sobre corrupção à Junta Autónoma de Estradas, que levou à extinção daquele organismo.

Passaram duas décadas e o País parece nunca ter saído do “pântano” a que Guterres alegadamente se referia, pelo menos no sentido figurado que o dicionário atribui à palavra: “vida ou conjunto de comportamentos considerados imorais”.

Na semana passada, em entrevista concedida ao jornal Sol, Henrique Araújo, presidente do Supremo Tribunal de Justiça, defendia, mais uma vez, a criação do crime de enriquecimento ilícito para combater o fenómeno da corrupção, instalado em Portugal. “Sabemos que os casos de corrupção têm aumentado e, apesar de a investigação a este tipo de criminalidade ter aumentado, os resultados ficam muito aquém daquilo que se sabe que existe”, admitiu o juiz conselheiro.

Esta semana, e depois de vários “casos e casinhos” que abalaram a credibilidade do Governo, o primeiro-ministro António Costa cai com estrondo, ao ver-se envolvido numa investigação por suspeitas de corrupção ligadas à exploração de lítio e hidrogénio verde. O Presidente da República anunciará esta quinta-feira a sua decisão, sendo a mais provável a dissolução do Parlamento e a consequente convocação de eleições antecipadas.

Na actual conjuntura económica e social, e no actual quadro de desconfiança generalizada nos políticos, esta era a crise que o País menos precisava e menos merecia.