Opinião

Cinema | e se depois?...

1 ago 2020 20:00

As ripas de madeira do passadiço estão gastas. Não estão degradadas, pelo contrário,  aqui e acolá nota-se que foram substituídas para manter o bom estado geral do acesso à praia

Tirando as indicações ENTRADA (a branco) e SAÍDA (num laranja algo desbotado pelo sol), que criam corredores virtuais pela direita ou pela esquerda, dir-se-ia que a pandemia pouco modificou…

Somos plantas, afinal. Procuramos o sol, a areia e a água e não há vírus que consiga alterar significativamente o ritmo do estio. Até porque diz que os raios ultravioleta matam o bicho e mais vale aproveitar agora enquanto ainda não está tudo a arder e os ingleses consideram que somos um destino turístico perigoso.

Espera…  afinal há marcas de que o vírus anda aí. Os empregados do bar da praia usam máscara e as pessoas fazem fila afastadas e com ar desconfiado. Nada que impeça que me cobrem 3 euros por uma imperial.

“Desculpa?”, pergunto eu. “Treis euro”, responde-me ele com sotaque de português açucarado. Enquanto coloco as moedas sobre o balcão tento disfarçar o desconforto com uma piadola: “Então e quando é que a próxima banda começa a tocar?”

Assumo que a falta de sorriso é por causa da máscara, mas se calhar devia era ter atirado com um “quando é que começa o sunset?”, para, pelo menos, parecer um bocadinho menos provinciano. Quem me manda a mim vir de férias para onde, diz a imprensa, há orgias milionárias?

Eu, que até vou de geleira azul e guarda-sol vermelho para o mesmo areal onde só em implantes de silicone deve estar o dobro do meu orçamento anual para refeições. Mas bom… Férias, finalmente! Desta é que vai: livros, jornais, filmes, séries, vai ser um fartote… Deixa aqui só…  
...
Já continuo, que agora a criançada quer banhos de mar e raquetes. E mais jogos da bola e castelos na areia. E mais mergulhos. E os crescidos querem passeios junto ao mar e grelhados e o barulho das rolhas a saltar das garrafas de vinho branco tão fresquinhas. 
… 
Aposto que, quando acabarem as férias, é que finalmente vou ter tempo para ir ver “Patrick” e a estreia na realização do Gonçalo Waddington.

Ou o documentário que o Diogo Varela Silva fez sobre o Zé Pedro dos Xutos, “Zé Pedro Rock ‘n Roll”, e que desde a estreia no DocLisboa ando a perseguir, sem sucesso.

No imediato, vou aproveitar o sol e a liberdade e o oblívio consentido. E as pessoas e a rua. Com máscara, claro! Vou levar um bocadinho a peito as palavras de Bernard Henry- Lévy em entrevista ao Pedro Mexia, no Expresso: «(…) “confinamento” é uma palavra fascista. (…) no confinamento há a ideia de nos fecharmos numa bolha auto-suficiente, com poucas janelas para o exterior. O exterior pode estoirar que isso não tem importância.»  

Ora, eu não queria mesmo nada que o exterior estoirasse porque ainda não acabei a minha cerveja de 3 euros.