Opinião

Banhos de água fria

5 ago 2023 10:07

Acabar com as birras não é possível. A não ser que o façamos de forma traumatizante

Só se for para adultos de cabeça quente. É impossível fugir à polémica em torno de uma mãe que “resolveu” as birras da filha de 3 anos dando-lhe banhos de água fria e publicitando esse facto nas redes sociais.

Sem querer fazer linchamento em praça pública, venho dar-vos algumas considerações profissionais sobre o sucedido. As birras são expressões emocionais normais das crianças. São pedidos de ajuda quando alguma necessidade está em falta (sendo ela sono, fome, cansaço, necessidade emocional ou outra).

As birras precisam de tradução. Qual o papel dos pais quando os filhos fazem birra? Atender às suas necessidades e redirecionar a birra para um comportamento ajustado. O adulto é quem controla a frequência, a duração e a intensidade da birra através da resposta que dá. Acabar com as birras não é possível. A não ser que o façamos de forma traumatizante.

Ora, o que aprendeu esta criança de 3 anos ao ser mergulhada num banho frio pela mãe enquanto fazia uma birra? Colocando por miúdos, “a minha mãe não é um adulto securizante e quando eu precisar dela vou ser agredida, logo o melhor é afastar-me dela.”

O que irá fazer esta menina quando for adolescente? Sujeitar-se ao mesmo ou pior porque banhos frios já não funcionam? Ou deixará de confiar neste adulto? Este género de práticas tem muito mais desvantagens no futuro do que a “vantagem” imediata de acabar com as birras.

Faço o apelo ao caro leitor que procure ajuda profissional caso tenha dificuldades em lidar com situações relacionadas aos seus filhos ou qualquer outro tema da sua vida. Seguir modas e tendências das redes sociais descritas por pessoas de forma completamente aleatória é perigoso.

Diziam que com a chegada da internet iríamos viver na era da informação, mas o que vemos com a disseminação destas práticas é a verdadeira desinformação relativamente ao que tem vindo ser estudado como eficaz na educação infantil nos últimos 30 anos no mínimo. Este tipo de práticas violentas é traumatizante e deixa marcas que duram uma vida inteira.

E não, uma palmada dada no momento certo é uma prática do século XX mas nós estamos a educar crianças para o século XXI. Se queremos crianças e jovens que usem do diálogo e sejam emocionalmente inteligentes, então os bons exemplos têm de vir de cima.

Já fez o exame de consciência se estará a ser um bom exemplo? Afinal quem são os primeiros influencers na vida de uma criança?