Economia

Há uma década que a Reci Qwerty dá nova vida ao lixo tecnológico

10 jun 2023 15:00

Sempre que um computador, telemóvel, impressora ou televisor é enviado para o lixo, há uma percentagem de metais raros que se perdem

ha-uma-decada-que-a-reci-qwerty-da-nova-vida-ao-lixo-tecnologico
Bruno Gaspar, gerente, e Joana Lopes, engenheira do ambiente
Fotografia: Jacinto Silva Duro
Jacinto Silva Duro

Quando a Reci Qwerty iniciou a sua actividade, há 11 anos, em 2021, o foco principal era a recolha ecológica de e-lixo.

Por outras palavras, esta empresa sediada na Zona Industrial do Arneiro de Fora, na Pelariga, em Pombal, especializou-se na reciclagem de sucata informática e outros equipamentos inteligentes, apostando na descaracterização, separação e reciclagem de lixo tecnológico. Foi pioneira.

Contudo, com o passar do tempo, o espectro da actividade alargou-se e passou a englobar praticamente todo o tipo de equipamentos eléctricos e electrónicos, de electrodomésticos a máquinas hospitalares, passando por máquinas industriais e, naturalmente, dispositivos informáticos.

“Estamos agora a fazer algum trabalho, não muito, numa nova área de negócio, devido às necessidades transmitidas pelos nossos clientes, que, por exemplo, têm equipamento de escritório que precisam de reciclar. Estamos também a começar a actuar mais intensivamente na destruição de informação e arquivos em papel e destruição de discos informáticos também. Ou seja, destruição de dados confidenciais”, explica Bruno Gaspar, gerente comercial da empresa.

A ideia na génese desta firma era a valorização dos materiais que constituem o miolo da maioria dos equipamentos informáticos.

Paulo Gaspar, pai de Bruno e fundador da Reci Qwerty, sabia, em 2012, que havia um mercado inexplorado na área em Portugal e resolveu apostar na recolha, junto de empresas, destes materiais que poderiam ser reciclados e voltariam a integrar a cadeia de valor.

Grosso modo, era como dar uma nova vida ou uma reincarnação a um velho PC, cujos elementos mais preciosos, muitas vezes, metais raros, podem, neste momento, fazer parte do seu telemóvel topo de gama, do seu smartwatch ou da televisão inteligente que tem em casa.

Isto acontece finda a vida útil destes equipamentos numa empresa, sempre numa lógica de economia circular.

Após a recolha, os materiais e placas electrónicas são desmantelados, separados, acondicionados e enviados para os clientes, na unidade da Pelariga, por uma equipa de duas dezenas de colaboradores.

“Cada componente é depois encaminhado para o destino correcto. O ferro para fundição de ferro, o alumínio para fundição de alumínio, os cabos eléctricos são enviados para remoção da cobertura exterior de plástico e as placas electrónicas, também vão para fundição, para fazer o aproveitamento dos metais nobres que estejam presentes nelas”, ilustra Bruno Gaspar.

Em termos de metais nobres, estas placas podem conter uma pequena percentagem de ouro, paládio, ródio, prata e platina.

“Há várias categorias de placas e cada uma tem a sua quantidade de componentes mais específicos.”

Caso a Reci Qwerty não fizesse esta recolha e separação, estes materiais valiosos seguiriam para aterro, representando um enorme desperdício de recursos, além de uma pesada factura ambiental, se tivermos em conta todo o esforço humano e o impacto na ecologia dos locais explorados e minerados para a sua extracção.

Além disso, como explica Joana Lopes, a engenheira do ambiente da Reci Qwerty, qualquer material, mesmo os aparentemente mais inócuos, é passível de provocar poluição.

Mesmo o ferro, com a libertação de ferrugem e outros tipos de materiais que contaminam solos acabam por ter impacto nos recursos hídricos.

“Reciclando, além de estarmos, em termos ambientais, a prevenir os impactos que vão advir de extrair novos materiais ao meio ambiente para fazer compostos, estamos a usar, os que já estão processados. Evitamos ainda todo o impacto relacionado com depósitos ilegais no meio de um pinhal”, diz.

A área de actuação da Reci Qwerty estende-se por todo o País, à excepção das ilhas, por uma questão não apenas de logística, devido aos custos que trazer materiais dos arquipélagos comporta, mas ainda porque a legislação é diferente nos Açores e na Madeira e porque fazer o tratamento de resíduos localmente é, economicamente, mais favorável.

“Desde que consigamos optimizar as nossas rotas, este trabalho, a nível nacional, é bastante viável, uma vez que se trata de um país relativamente pequeno. Trabalhamos de Braga a Faro”, adianta Bruno Gaspar.

Embora a empresa de Pombal venda os materiais já separados a intermediários portugueses, o responsável da empresa sabe que os metais cam no mercado nacional, para fundição, mas que os resíduos eléctricos e electrónicos acabam por seguir caminho para destinos no estrangeiro, dentro da União Europeia.

“Acredito que vão para a Alemanha, mas não tenho a certeza. Mas sei que é na União Europeia que eles estão a ser valorizados.”

No final da operação, mesmo os metais, após separação e fundição, podem acabar nas mãos de um qualquer gigante tecnológico, para serem incorporados na próxima geração de veículos automóveis, frigoríficos, ar condicionados ou até mesmo em controladores de abrir e fechar portas num elevador. O que importa, no final de contas, é que a economia reutilize estas matérias-primas.

Optimização de rotas

Para produzir o mínimo de pegada ecológica, Joana Lopes explica que a Reci Qwerty, que conta com certificações nas normas ISO 9001, ISO 14001 e WEEELABEX, alcançada pela “excelência no tratamento de Resíduos de Equipamentos Eléctricos e Electrónicos (REEE) e Processo de Preparação para Reutilização a nível europeu, tem como grande preocupação a optimização de rotas de recolha, para baixar o consumo de combustível e a emissão de gases com potencial de efeito de estufa.

“Planeamos os trajectos de maneira a conseguir que os veículos regressem cheios, com os mínimos desvios e no menor número de quilómetros possível. De resto, como o nosso desmantelamento é uma operação manual, acabamos por não ter emissões atmosféricas. E controlamos os nossos consumos energético e de água.”

Previsões

No futuro, a empresa de Pombal pretende alargar a operação para outros tipos de resíduos, indo sempre ao encontro das necessidades dos clientes.

“E sempre que surgir alguma oportunidade de expansão para uma outra área da reciclagem, vamos estar sempre atentos ao mercado, para perceber quais são as necessidades”, garante Bruno Gaspar.

O gerente comercial adianta que está em marcha, embora numa fase “muito, muito embrionária”, uma ideia de investimento ao abrigo do Plano de Recuperação e Resiliência.

“Temos ainda um outro projecto de natureza energética, que já está em andamento, em parceria, com a EDP Comercial. Nas empresas que tenham um determinado consumo energético contratado, a EDP faz a instalação gratuita de painéis solares e durante o pico de funcionamento dos painéis solares, há uma redução no custo energético e aumento da eciência. Estamos ainda a analisar projectos possíveis, para alargamento das nossas instalações e da nossa área de trabalho”, resume o responsável.