Desporto

Barbas do Marrazes deixou-nos aos 68 anos

23 jan 2017 00:00

“Já fiz de tudo. Massagista, roupeiro, taberneiro, presidente é que não. É o clube da minha terra e defendo-o com unhas e dentes"

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Deixou-nos mais uma icónica figura da região, João dos Santos. O Barbas do Marrazes que, um dia, prometeu que só cortaria o longo e farfalhudo pêlo facial, quando o Sport Club Leiria e Marrazes (SCLM) chegasse à 1.ª Divisão.

João dos Santos tinha 68 anos e faleceu ontem, domingo, dia 22, mais de 40 anos depois de ter feito a promessa.

Leia aqui o artigo que o JORNAL DE LEIRIA publicou sobre o mítico "Ti João" e o seu amor pelo SCLM.

Consta que Ti João só cortará a barba quando o Marrazes chegar à 1ª Divisão. Será verdade?

E se de repente, na Aldeia do Desporto, lhe aparecesse um senhor pela frente com uma longa barba branca? Seria o Pai Natal? Nada disso. Trata-se de João das Barbas, o homem que se diz ter feito uma promessa, no mínimo, curiosa.

Há quem garanta que ele só irá ao barbeiro alterar a sua imagem quando o Leiria e Marrazes atingir o primeiro escalão do futebol português. Será?

João das Barbas é uma figura incontornável quando se fala no Leiria e Marrazes. Das pessoas mais estimadas no clube, é o seccionista da equipa de benjamins AA, composta por míudos até aos 10 anos, que o tratam, garante, com “muito carinho”. Os mais novos até o chamam de Pai Natal, um Pai Natal que lhes dá afecto, que lhes aperta os atacadores das chuteiras e que todos os dias lhes dá mais uma lição para fazer deles grandes homens no futuro.

Ti João, João das Barbas ou, como está no bilhete de identidade, João Amaro Fernandes dos Santos é serralheiro civil e vê o Leiria e Marrazes, clube ao qual está ligado há 35 anos, como a sua “segunda família”. 

“Já fiz de tudo. Massagista, roupeiro, taberneiro, presidente é que não. É o clube da minha terra e defendo-o com unhas e dentes, mas sempre com respeito pelo adversário. É para onde saio de manhã aos fins-de-semana. Se calhar devia ficar na cama, mas sinto-me melhor assim...”

Já a falta de rivalidade existente com a União de Leiria nos dias de hoje é que estranha. “Até chateia, já nem ralham uns com os outros...”

A origem
A famosa barba, essa, já tem um longo percurso de 38 anos. Foi em 1972, depois de concluir o serviço militar, onde era obrigado a fazer a barba “de manhã e à noite”, que Ti João se cansou. “Assim que me vi livre daquilo nunca mais fiz a barba. Até hoje”, garante. A única excepção foi há 12 anos, quando foi operado ao coração. “Com medo que mexessem, optei por cortar.”

Uma barba que não é aparada, mas que requer muitos cuidados. Todos os dias são “uns 15 minutos” para lavar, pentear e desfrisar. Cortes e aparadelas é que não. “É o que a cepa dá”, garante.

Atletas, dirigentes, técninos e adeptos do clube e de outros com que o Marrazes joga tratam-no sempre com “respeito”. As excepções são raras. “Ainda há miúdos e dirigentes com má formação, mas isso passa-me ao lado.”
E a promessa, existe? Com ironia, João das Barbas não confirma nem desmente. “Assim se vão enganando os tolos. Também nunca disse se era a 1ª Divisão nacional se a distrital...” A verdade, não o nega, é que já não se imagina sem a sua longa barba branca. E garante que “90%” dos atletas que teve ao longo destes anos só o conheceram com este look

Entre os miúdos que passaram pelas suas mãos destaca aquele que leva o nome do Marrazes mais longe, Rui Patrício. “Era um miúdo envergonhado e humilde, que se calhar não queria ser guarda-redes, mas acabou por sê-lo e ainda bem. Continua a vir visitar-nos sempre que pode. Para os miúdos é óptimo.”

A prenda para o Pai Natal
O que João das Barbas queria mesmo é que houvesse mais suporte para o trabalho que é feito no Leiria e Marrazes, clube que tem tido um crescimento exponencial nos últimos anos.

“Não temos o apoio de ninguém. As entidades competentes não vêem que estamos a formar cidadãos. Ninguém é remunerado e só em inscrições gastámos 5.492 euros.” Por isso, pede a ex-atletas e amigos do clube para regressarem e ajudarem.

“É bonito ver estes miúdos a crescerem. Estamos a criar homens e não jogadores de futebol, porque isso só dois ou três é que conseguem. O clube está cheio de força outra vez e pode ficar ainda melhor.”

(Artigo publicado originalmente a 23 de Dezembro de 2010)