Economia

Ausência de ferrovia pode penalizar mercadorias na Europa devido ao carbono

1 out 2023 08:00

Alerta para a inexistência de um hub de transportes ferroviário, para escoar as mercadorias, numa Europa que se prepara para usar as taxas carbónicas como medidas proteccionistas

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Com preços de produção iguais, produtos nacionais poderão ser preteridos, por um simples cêntimo de taxa carbónica
Fotografia: Freepik
Jacinto Silva Duro

Quando António Costa e Silva, ministro da Economia e do Mar, esteve em Leiria no final de Julho para apresentar as ajudas do Banco Português de Fomento (BPF), das Agendas Mobilizadoras, da Agência Nacional de Inovação (ANI) e do Portugal 2030, foi confrontado com a visão de quem está no terreno.

Os empresários que actuam nos mercados internacionais alertaram para o facto de não existir um hub de transportes ferroviário, para escoar as mercadorias, numa Europa que se prepara para usar as taxas carbónicas como medidas proteccionistas.

Qualquer produto fabricado para lá dos Pirenéus está praticamente no centro da Europa e tem vantagens carbónicas, enquanto Portugal depende do poluente transporte rodoviário.

Num mercado globalizado, com custos de produção e de trabalho semelhantes entre países, um produto que seja taxado em apenas um cêntimo por ser transportado em camião e não por comboio, será sempre preterido.

Portugal está a apostar em comboios de alta velocidade para passageiros entre Lisboa e Porto, mas, em pleno século XXI, não há sequer uma ligação ferroviária convencional com Madrid ou com França.

A situação é penalizada pela opção de se apostar em carris mais estreitos do que no resto da Europa, a “bitola ibérica” de que Espanha se está a desfazer.

A Nerlei – Associação Empresarial da Região de Leiria, os dirigentes associativos e autarcas chamaram a atenção para a falta de ferrovia.

Um dos sectores que, previsivelmente, neste cenário, sofrerá com taxas carbónicas será o das exportações automóveis, essencial ao País, como se retira das consequências da paragem da Autoeuropa, devido a inundações na Eslovénia.

“Será um problema maior nas empresas de produção de plásticos e dos componentes com produção contínua, que têm de expedir de forma regular e onde os custos logísticos têm uma importância grande”, prevê Manuel Oliveira, secretário-geral da Cefamol - Associação Nacional da Indústria de Moldes.

Na ausência de alternativas, com taxação carbónica dos combustíveis rodoviários, haverá também uma quebra na competitividade, mesmo que numa margem pequena.

“O transporte ferroviário pode ser parte da solução, mas obriga a um investimento nacional e estrutural, que levará o seu tempo.”

Já o presidente da Nerlei, António Poças, acredita que “é imperativo que as empresas possam escoar os seus produtos, para o centro da Europa, por ferrovia. Na realidade, como temos alertado, o problema não é somente a sustentabilidade carbónica. Pode estar em causa, também, a aplicação de taxas por alguns países que, forçosamente, temos de atravessar, para dissuadirem o transporte rodoviário”.

Uma coisa é certa, refere o empresário, cada vez mais, os consumidores estarão atentos à pegada ecológica dos produtos e isso vai ser um “factor de diferenciação”.

“Portugal, pela sua situação periférica e quase exclusiva utilização do transporte rodoviário, ficará muito penalizado nesta situação”, resume.

António Poças ressalva que o transporte rodoviário está em vias de se “descarbonizar” pelo hidrogénio, electrificação e outras tecnologias.

Quando questionado se o investimento em ferrovia e numa plataforma logística, como aquela que o município e a Comunidade Intermunicipal da Região de Leiria (CIMRL) preconizam para a região, já deveria ter sido criada e estar em funcionamento, Pedro Pimpão responde “há 20 ou 30 anos que deveria estar a funcionar!”.

O presidente da Câmara de Pombal sublinha as “condições ímpares de acessibilidade” da região para ter plataformas logísticas, que permitam aumentar a competitividade das empresas.”

Pimpão, lembra que, na localidade de Carriço (Pombal), para onde a Cimrl defende a criação de uma plataforma logística, “confluem” a Linha do Oeste, a A17/A8 com ligação ao IC8 à A1 e ao interior de Portugal e Espanha, e à Linha do Norte.

“Com a proximidade do porto de Figueira da Foz, teríamos um hub logístico. O Governo, no âmbito do Portugal 2030, tem 66 milhões de euros para electrificar a linha do Oeste, das Caldas até à estação do Louriçal [Carriço], isso significa que a modernização da linha do Oeste vai trazer oportunidades para empresários e transporte de mercadorias”, diz.

Na sua perspectiva, dever-se-ia aumentar a capacidade da Linha do Norte e preparar uma ligação a Madrid.

A intenção de criar a plataforma logística será integrada pela CIMRL nas candidaturas ao Portugal 2030.

“Menos velocidade e maior quantidade”, como princípio, deveria ser o objectivo número um, para Manuel Oliveira.

A anunciada entrada da espanhola Renfe na ferrovia portuguesa pode trazer concorrência e novas soluções, que o responsável acredita serem saudáveis.

“Obriga os outros a acelerar processos e a serem mais agressivos, no serviço e preços. Pode ser a acendalha, para desbloquear e ser um elemento positivo para acelerar o processo.”