Entrevista

Ricardo Cardoso, psicólogo: "As crianças têm de ser 'domesticadas', como os animais"

15 abr 2021 10:37

O psicoterapeuta, explica que devemos conhecer as emoções, para aprendermos a lidar com elas, diminuindo a ansiedade e conflito. Adianta que os pais devem reservar tempo para entender e ajudar os filhos a gerir os sentimentos

"Tudo é ser-se homofóbico, tudo é ser-se machista, xenófobo, tudo é isto e aquilo... E se investissem na construção do 'respeito pelo outro'?"
Ricardo Graça
Jacinto Silva Duro

Durante a apresentação do seu último livro, Super Filho Como o Educar, disse que educar um filho não é apenas esperar que o percurso académico o mastigue e cuspa escorreito e bem formado, pronto a enfrentar a vida...
Participo numa equipa de intervenção precoce na Cercilei e trabalhamos com crianças dos 0 aos 6 anos e reparei que há algumas pessoas a dizer que não é preciso estimular os bebés e que a educação é tudo produto da geração espontânea. De facto, se eles não forem estimulados para comunicar, para se moverem, para palrarem, o desenvolvimento vai acontecer mais lentamente e, por vezes, até não acontecerá. Por exemplo, na questão da integração sensorial, o percurso de um bebé deve ser rolar, enrolar, depois sentar-se e daí começar a gatinhar. Muitas crianças não passam por isso e, depois, têm má coordenação motora, pouca destreza ou dificuldades na escrita.

É a ideia de que um "bebé bonito" é aquele que come, dorme e “não chateia”?
Exacto! Isso é horroroso. Quando vou a uma casa no âmbito da intervenção precoce, e vejo isso, dá-me vontade de bater!

No seu livro, afirma que os pais precisam de observar os filhos e investir tempo a perceber-lhes as reacções, a brincar com eles, a bater palminhas e todas aquelas coisas que os nossos pais e avós nos faziam.
Estamos preparados para ser pais e cuidadores. As mulheres mais do que os homens. Actualmente, temos coisas que nos distraem e nos fazem perder essa parte da relação. "Não tenho tempo", dizemos. Não temos tempo, porque optamos por fazer outras coisas. No tempo dos nossos pais, havia mais tempo porque eles valorizavam mais a família e estavam focados nos filhos. O pai focava-se em manter a estrutura familiar segura e sem necessidades. Se virmos a história e abordarmos o ponto de vista biológico, o homem tem o corpo que tem, para proteger, a mulher tem o corpo que tem, para cuidar, para dar mimo... E isto é importante num momento onde, na sociedade, tudo é ser-se homofóbico, tudo é ser-se machista, xenófobo, tudo é isto e aquilo... E se investissem na construção do “respeito pelo outro”? Os adolescentes, hoje, têm distúrbios grandes devido a estas ideias que ditam que o homem e a mulher são iguais. Não! Não somos iguais! Mas temos de nos respeitar. Os adolescentes estão a dar uma volta estranha a tudo isto e temo que possam vir daí coisas más devido ao exagero. Parece-me que a minoria começará a discriminar a maioria. Isso assusta-me, porque pertenço a uma minoria, aos gordos, e não quero que os gordos discriminem os magros, porque eles é que estão bem!

Defende a "equidade", a adaptação da regra à situação concreta, a fim de deixá-la mais justa para todas as partes?
Sim. E é preciso investir na construção do respeito. Se, por exemplo, respeitarmos as pessoas magras e gordas, está tudo bem. Pensa-se que basta dizer que o respeito é "bom-senso". Mas o que é o bom-senso? Parece que toda a gente tem bom-senso ou, pior, acham que o bom-senso e senso-comum são a mesma coisa. O senso das multidões - o senso-comum - não é bom-senso. O que é que as manadas fazem, mesmo sem querer? Destroem coisas. As multidões fazem o mesmo. Gente muito junta e com um único foco, têm raiva e essa raiva destrói. Um dos capítulos que abordo no meu livro é a gestão emocional. As pessoas não têm auto-conhecimento suficiente da sua construção emocional, para não irem atrás da manada.

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