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Todos os "Caminhos do Naturalismo" vão dar a Figueiró

13 out 2016 00:00

Até final de Dezembro, Os Caminhos do Naturalismo em Figueiró dos Vinhos – O Grupo do Leão e a arte moderna de Silva Porto, Columbano, Malhoa, Pinto, Maria Augusta Bordalo Pinheiro e outros leões vão dar ao Museu e Centro de Artes de Figueiró dos Vinhos

Município está a apostar em turismo cultural diferenciado
Jacinto Silva Duro

Figueiró dos Vinhos tem vindo, desde 2013, a afirmar-se na exposição de trabalhos de alguns dos mais importantes pintores naturalistas do final do século XIX e início do século XX, ao acolher mostras com algumas das mais importantes obras do naturalismo nacional.

A maioria das obras faz parte do acervo de museus, como o Museu Nacional de Arte Contemporânea - Museu do Chiado, Museu de José Malhoa, Palácio Nacional da Ajuda, Casa-Museu Anastácio Gonçalves e de coleccionadores particulares.

O Museu e Centro de Artes de Figueiró dos Vinhos foi inaugurado a 24 de Junho de 2013 e, em conjunto com o Casulo de Malhoa, casa do pintor na vila, é um dos pontos de atracção local para os turistas.

A aposta do município na ligação a estes artistas é uma mais-valia que ainda dará mais frutos. Gonçalo Brás, da Câmara de Figueiró dos Vinhos, revela que haverá mais exposições e reforço da cooperação com o Museu do Chiado, entre outras acções que envolvem mesmo a criação de uma Rota Urbana de Malhoa e um esforço para dotar o Casulo de material expositivo, ao nível da multimédia e mesmo de peça originais do autor, com o objectivo de potenciar o turismo cultural no concelho. “As exposições são apenas uma pequena parte do que está projectado”, afirma.

Mas porquê uma ligação ao naturalismo? A razão pode ser encontrada na forte ligação de José Malhoa a Figueiró dos Vinhos, onde tinha um atelier e onde viveu parte da vida, e a amizade que aquele pintor tinha com outros nomes das artes plásticas nacionais, como Silva Porto, Columbano, Malhoa, Pinto, Maria Augusta Bordalo Pinheiro e outros artistas do chamado Grupo do Leão.

Acerca deste colectivo de artistas que pintavam rostos e paisagens, com motivos simples mas também de despudorada candência, Bartolomeu Sezinando Ribeiro Artur escreve no catálogo Arte e artistas contemporâneos, para uma exposição do Grémio Artístico, em 1896, que “Malhoa [expõe] uns quadros de género, simples pastorais, que parecem ter sido feitos de colaboração com o seu colega Henrique Pinto, tanto a factura deles se assemelha à deste artista. Houve quem chamasse àquela série ‘Escola de Figueiró dos Vinhos’. Em toda ela se distinguem as mesmas qualidades, e avultam os mesmos defeitos.”

E que defeitos e qualidades eram estes que, por um lado, aborreciam e, por outro, entusiasmavam o crítico, escritor e pintor Ribeiro Artur? A teimosia destes pintores em procurar captar nas telas a paisagem “do natural”, já introduzido pela anterior geração romântica, de Garrett e companheiros, evidentemente.

Não obstante, em 1879, quando Silva Porto, bolseiro da Coroa em Paris, apresentou esta visão como proposta de arte moderna, granjeou grande apoio e sucesso junto do público francês.

A reacção contagiou artistas como Ramalho Ortigão, que visitou o pintor para encetarem, em conjunto, grandes conversas sobre a importância da representação da “natureza viva dos campos” e da pintura ao ar-livre, em viagens pelo País.

No meio desta discussão, eis que entrou em cena um dos maiores nomes da arte portuguesa e, certamente, um dos mais famosos artistas do norte do distrito, José Simões de Almeida, Tio.

O mestre escultor na Academia de Belas-Artes, apressou-se a sugerir a José Malhoa e Henrique Pinto, seus discípulos de longas temporadas em Figueiró dos Vinhos porque, no seu entendimento seria “escusado andar de trouxa às costas a percorrer o País”, quando na vila tinham tudo: paisagem, luz, motivos e modelos populares para pintar.

E Simões de Almeida tinha para o provar os anos que ali havia vivido e as frequentes deslocações à terra- natal. Os dois amigos concordaram com o lente, arrumaram alguns pertences e seguiram na primeira de muitas viagens de Lisboa até às serranias virgens e intocadas da antiga comarca de Figueiró, assentando arraiais na vila.

Pinto casou ali e Malhoa mandou construir lá uma casa de tijolos vermelhos, o Casulo, onde passava meio ano, com vista a perder de vista para a serra, a dois passos do jardim municipal. Dos seus pincéis e paletas brotaram rios de cor e traço, que foram esculpindo um retratado do norte do distrito, mas também de um Portugal modorrento e esquecido pelo bulício de Lisboa e Porto.

Com o tempo, outros artistas começaram a seguir-lhes o exemplo, demorando-se em semi-extâse criativo e contemplativo, naquela espécie de tranquilidade alpina encravada a meio do Pinhal Interior. Centro de artes voltado para a pintura Viajemos agora até à primeira década do século XXI.

Desde 2013 que o Centro de Artes de Figueiró dos Vinhos e o naturalismo do final do século XIX/início do século XX têm andado de mãos dadas. Numa série de mostras dedicadas à corrente, têm passado obras valiosas de Malhoa, Columbano e Silva Porto, entre outros, pelo espaço, atraindo centenas de visitantes.

Casos e Mistérios
Beatriz Costa e A Menina do Laço

Numa das exposições que já passaram por Figueiró dos Vinhos, intitulada Os Caminhos do Naturalismo em Figueiró dos Vinhos. Casos e Mistérios, o visitante deparava-se, frente-a-frente com o retrato A Menina do Laço, de José Malhoa (ao lado), que, muitos especialistas concordam que pode ser um retrato da conhecida actriz Beatriz Costa, em criança.

A estrela do cinema dos anos 30 e 40 escreveu nas suas memórias sobre essa representação, referindo que a sua mãe "era costureira em casa" de José Malhoa e que "um dia o pintor fez o seu retrato", ainda sem a famosa franjinha.

Com os devidos cuidados, o mistério d’A Menina do Laço não afirma indubitavelmente de que se trata de Beatriz Costa, porém, as datas coincidem e há semelhanças com as fotografias de juventude da actriz, quando criança.

A conclusão foi do investigador Luís Borges da Gama, que detectou várias referência de Beatriz Costa ao quadro: “Malhoa pintou-me o retrato", "fui modelo do Malhoa" e "pareces uma Gioconda pequenina”.

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