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Ricardo José Lopes: “Temos de ser tão bons em Leiria, como no Japão”

11 nov 2016 00:00

Ricardo José Lopes, 38 anos, viveu em Leiria até ir para a universidade.Não ganha fortunas, trabalha “por cêntimos”, mas, agora, sente-se feliz. E paga sempre aos artistas.

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Jacinto Silva Duro

Voltou a organizar as LX Jazz Sessions, em 2016, na Bica, em Lisboa, ao fim de um hiato de 9 anos. Porquê?

Este foi um projecto que começou em Leiria, em 2003-2005, na cervejaria Camões, aos domingos. A ideia começou a partir de um movimento a que pertenço, a Cooltrain Crew, com ligações ao drum'n'bass e jazz. Na época, estava a passar alguns fins-de-semana em Leiria, por motivos familiares, e resolvi criar um projecto, com o carimbo da Cooltrain, que fosse formador e mostrasse a diversidade no jazz. Era importante pegar no passado do estilo musical e mostrar que ele está em muitos géneros. Tivemos sempre músicos de muita qualidade - foi o caso do David Binney e o Craig Taborn. O domingo era um dia difícil de trabalhar e a ideia era que o projecto pudesse vingar por si próprio. Nestas ocasiões, o público está atento e quer consumir um produto cultural. Às quintas, sextas e sábado, as pessoas saem porque é quase, socialmente, obrigatório sair. Mas não estão atentas e a sua relação com a cultura é menor.

Tinham quase sempre sala cheia.
Na Camões, tínhamos 172 lugares sentados e a sala cheia. Tendo nós a formação e a informação, há um distanciamento e intelectualização tão grande das artes que o público perde-se e foge, por isso, tentámos mudar o panorama. Como? Um dos domingos do mês era dedicado a um ícone do jazz: Miles Davis, John Coltrane... fizemos 24 tributos. Havia dois DJ, um deles era o Johnny, co-fundador das Jazz Sessions, o outro era o João Barbosa - que é o "branco", dos Buraka Som Sistema - e ainda fazíamos um tributo a um autor, escritor, poeta português e essa ponte era feita pela sua vida e obra. Juntámos Miles Davis a Fernando Pessoa, Duke Ellington a Natália Correia, Charlie Parker a Cardoso Pires. A ponte era o escritor Antonio Tabucchi, que fazia essas combinações.

Formou público, em Leiria?
Houve duas coisas que mostraram que o projecto fazia a diferença, desde o primeiro dia. O primeiro foi um casal, perfeitamente normal, que me abordou a agradecer. Admitiram que não sabiam o que era jazz antes das Jazz Sessionse, depois delas, tinham comprado dois álbuns. O primeiro era da Sarah Vaughan, numa onda fácil do swing, e o segundo era do Thelonius Monk. Surpreendeu-me. Era um caminho difícil! Enquanto agentes culturais, é isto que devemos transmitir. Outra coisa que me marcou bastante foi um grupo de miúdos do liceu, que tinham uma banda de rock, iam aos concertos ao vivos e perceberam o nível dos músicos que lá estavam - André Cascais, Júlio Resende ou Carlos Barreto. No final, iam falar com os artistas. Alguns deles, são hoje músicos de jazz: é o caso do Joel Silva ou do Paulo Santo. O projecto em Leiria acabou, porque todos os projectos devem ter um princípio, meio e fim.

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