Opinião

A prateleira

16 ago 2018 00:00

Tem entre os 82 e os 85 anos de idade. A estatura é mediana, as ancas secas e assimétricas. Veste um tailleur preto, de terylene, de corte comum mas bem escovado.

Por debaixo da lapela enfeitada com um alfinete de pedras não preciosas uma camisola de gola alta fúcsia.  70% lã, 30% polyester sem borboto, que lhe acentua o tom rosado das faces. Os sapatos são de salto médio em forma de cunha para acautelar as quedas e a mise, a mise é irrepreensível e fofa e arrasta ainda o odor a laca.

Aproxima-se timidamente da empregada do pequeno supermercado do bairro e diz-lhe que procura um creme adequado à sua idade. Sabe que existe um de uma marca conhecida, de preço ainda assim em conta, para rugas fundas mas não o encontra nas longas filas de prateleiras da loja.

As rugas são realmente muito profundas. Parecem anunciar que trabalhou muito. Talvez ao sol no campo ou então em casa, muito, a cuidar de acamados. A empregada explica-lhe que os cremes estão divididos por categorias - peles de 30, 40, 50, 60, 70 e 80 anos. Ela só sabe que o creme é daquela marca e que é para rugas que parecem sulcos.

A empregada dirige-se então à prateleira dos 80. "Acha que este chega para o que pretende?", pergunta-lhe.  "Não as faz desaparecer, pois não? Gostava é que me mantivesse o tom rosado da pele..." A empregada devolve-lhe uma competente explicação sobre hidratação de peles maduras e convence-a a optar pelo boião destinado às peles de 80.

Paga com dinheiro vivo. Talvez não tenha cartão multibanco ou não saiba mesmo como usá-lo. O creme não é barato e as nota

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