Opinião

O Brexit cultural

29 jun 2016 00:00

Quando este texto for publicado, já saberemos se o Reino Unido continua “entre nós”, ou se, pelo contrário, os bifes escolheram o caminho do “orgulhosamente sós”.

É incrível como as pessoas se esquecem da história com tanta facilidade. Para além das questões económicas e sociais, provavelmente as que mais têm estado no centro das discussões mediáticas, há um problema que o Brexit vai criar - de raiz - e que se prende com a promoção e difusão da cultura e com o consumo cultural.

Se há coisa em que a Europa é rica é na “promiscuidade” cultural permitida pelo livre trânsito de pessoas na União Europeia. De tal forma que, por exemplo, já ninguém se lembra o difícil que era antigamente ter qualquer tipo de espectáculo estrangeiro a passar por Portugal com a frequência com que agora passam. Como era impensável também ter milhares de ingleses a virem a Portugal para os festivais de Verão. Aqueles festivais onde a esmagadora maioria dos artistas é, precisamente, britânica.

Pois isso, com o Brexit, acabou-se. Acham que os promotores portugueses, franceses, espanhóis ou quem quer que seja, vai aceitar gastar o dobro do dinheiro e ter o triplo das chatices para construir os seus cartazes? Acham que os putos brits vão ter paciência para pedir vistos com não sei quanto tempo de antecedência para virem gastar dinheiro em Portugal? E os discos? Quanto é que vão custar os teus amados vinis das tuas adoradas bandas insulares?

É preciso não esquecermos que a cultura é, também, uma indústria e que a estratégia dos festivais, promotores e editores lusos - vários deles leirienses - passa, certamente, por contar com um mercado com a potência financeira do britânico, em que quem viaja atrás de música tem dinheiro para gastar e quer gastar.

Neste momento, com o referendo já aviado, ou estamos todos aliviados, ou deveríamos estar muito preocupados e a fazer contas à vida.

*Editor-in-chief VICE Portugal