Opinião

Música | Joel, Júlio e Salvador

11 abr 2019 00:00

Ao entrar por estradas espanholas tenho sempre o impulso de fazer zapping pelas rádios de nuestros hermanos até acabar sempre na Radio 3.

Ontem não foi excepção mas como se ouvia uma música do novo disco de Salvador Sobral ainda estive por breves momentos em dúvida se estava mesmo a sintonizar a frequência certa ou se esta ainda era sobreposta por alguma rádio nacional.

Quando se vez ouvir a voz do apresentador tirei as dúvidas e numa das principais rádios espanholas fazia-se um destaque ao novíssimo Paris, Lisboa.

Vários temas seguidos, sempre intercalados com informações entusiastas sobre o facto do disco ser cantado em várias línguas - português, inglês, francês e espanhol-, e revelar uma voz e aura únicas de um intérprete maior como Salvador, assumindo cumplicidades marinadas entre o jazz, a world music e o formato canção, talhadas por um compositor único como Júlio Resende, sempre com uma produção absolutamente sublime por Joel Silva (curiosamente, um músico que nasceu em Leiria e há muito se tem movimentado a partir da esfera do lisboeta Hot Clube).

Até poderíamos pensar que, numa rádio espanhola, o foco se centraria nas canções em castelhano mas, para nossa surpresa (ou não), os maiores destaque foram três temas em português e o dueto com a sua mulher, em francês.

Ao longo de meia hora não se falou de Festival da Canção e tal não era de todo necessário para mostrar que estamos perante um disco que se assume como um dos grandes lançamentos mundiais do ano.

Salvador já não é o “irmão da Luísa” nem o “vencedor do festival”. Em poucos meses, com a muito pouco fogo de artifício e muito trabalho de toda a sua equipa geriu o mediatismo e montou as bases de uma carreira que tem tudo para seguir de vento em popa a um nível planetário.

Por muito massacrado que tenha sido pelo omnipresente Amar pelos dois, ninguém pode ignorar uma diferença abismal entre Excuse Me e este Paris, Lisboa. O novo de Salvador Sobral é um daqueles discos tão honestos e tão bem construídos que poderia ser uma edição de uma qualquer editora de renome mundial e podia bater-se, de igual para igual, contra qualquer concorrência numa disputa de prémios mundiais.

Apesar do seu título só mencionar duas cidades, este é um disco com mundo e do mundo, com uma elegância e bom gosto absolutamente desarmantes. E o reconhecimento que aí vem promete (e ainda bem) ser inequívoco.

*Fundador da Omnichord Records