Opinião

Mais adulto criança, menos criança adulta

2 dez 2016 00:00

E sei que não quero ter um filho adulto que se esqueça de ser criança de vez em quando.

É oficial, o Ninja chegou à idade de responder. Aos 4 anos, ser engraçadinho e respondão, promete-nos em doses iguais, risada e urticária no cérebro. No outro dia, à mesa, a mãe disse-lhe que ele tinha de comer tudo para crescer, ao que ele respondeu: Mãe, não é a comer que se cresce… é a fazer anos! De seguida, ao deitar, vem despedir-se de mim, e eu, um pouco palerma, digo-lhe: Vá, boa noite, porta-te bem! Portar-me bem?! Claro que me vou portar bem, vou estar quieto a dormir! Oh pai cabeça de bacalhau! Olha olha, que até a formiga já tem catarro.

Esta é uma pequena parte, da parte cómica da coisa, mas também há a dimensão séria da questão. Reparem. Ultimamente, ao ser contrariado, franze o sobrolho, deixa cair os ombros e dispara arreliado: Eu quero fazer tudo o que me apetece! Eu, como é óbvio, solidarizo-me de imediato. Pois meu filho, nesse ponto, entendo-te mesmo bem. Sabes porquê? Por que se há coisa que eu gostava de fazer sempre, era isso do “tudo o que me apetece”. Por exemplo, apetece-me jantar sem tu ou a tua irmã chorarem sem razão credível, num futuro não muito longínquo, mas não posso. Também adorava aplicar um sortido de sevícias e chapadas a vários marmanjos com os quais tenho de lidar, mas não posso. Claro que não lhe digo isto, tento que a resposta seja mais polida e pedagógica, algo deste calibre: Não podemos fazer tudo o que nos apetece, meu amor, imagina que te apetece andar sempre de costas, sempre de marcha atrás a fundo para todo o lado, era engraçado, não era?

Mas ias acabar por tropeçar num degrau e os teus dentinhos iriam cair pelas escadas como os berlindes que andam sempre por aqui espalhados, depois o pai tinha de os arrumar num frasco, como faz com os berlindes. E isso era doloroso, para ti e para o pai, que já não se baixa como antigamente. Isso é o que vamos ver, dispara ele, desafiante, enquanto caminha de costas para a saída do quarto. E é aqui, que um pai incauto balança no frágil equilíbrio entre domar a criança choné, aventureira e confiante e ter um filho desdentado com pontos na testa. Eu não sei qual é o caminho, mas sinto que ele tem tempo para ser padronizado, ou compatibilizado, com a vida adulta.

E sei que não quero ter um filho adulto que se esqueça de ser criança de vez em quando. Porque nesse caso ele estaria impossibilitado de ir buscar o meu neto à escola e regressar a casa sempre de costas enquanto ouve da criança: Pai, estou sem cuecas! Sem cuecas?! Como é que isso aconteceu? A mãe vestiu-me uns boxers! Hahaha…vou-te inscrever nos malucos do riso. Hey, cuidado com o degrau!