Opinião

Fazer nada

4 ago 2016 00:00

Contudo, numa época de tanta precisão tecnológica e dispondo nós já da nanociência, como é possível anunciar-se uma ocorrência que vai mexer com a existência de todos nós e não terem os arautos o cuidado de precisar a hora?

Está um calor que leva qualquer pessoa a desejar fazer nada, que é uma coisa diferente de não fazer nada. Por força disso mesmo resolvi-me a escrever sobre coisa nenhuma.

1. Hoje é quinta, dia 28, e esta crónica sairá a 4 de agosto. Sairá, porque acabo de ler, numa daquelas notícias que nos caem no colo vindas sabe-se lá de onde, que há uma profecia antiga que aponta o final do mundo para amanhã, dia 29 de julho de 2016.

Até aqui menos mal. Passeio os ossos há cinquenta e oito anos e já perdi a conta aos apocalipses anunciados. Um deles assustava, mais pela repetição do que pela convicção: “aos mil chegarás, dos dois mil não passarás”, pelo que ou alguém se enganou a contar os anos ou a coisa já passou e, distraído como sou, a coisa deu-se e eu não dei conta e ando para aqui ao engano.

Por isso, este é só mais um entre tantos. Contudo, numa época de tanta precisão tecnológica e dispondo nós já da nanociência, como é possível anunciar-se uma ocorrência que vai mexer com a existência de todos nós e não terem os arautos o cuidado de precisar a hora? Que o mundo vai acabar amanhã, pois que seja! Mas a que horas? É que estes pormenores também contam. Se não vejamos, a senhora que me passa a roupa a ferro está de férias, logo eu tenho que saber se o anúncio do fim é logo para de manhã, e aí visto um camisolita qualquer, ou se vai ser lá mais para a tarde, o que já me obriga a ir passar uma camisa a ferro para levar amanhã para o trabalho. Na dúvida vou mas é pôr um disco a rodar ou sintonizar um programa de rádio, montar a tábua e o ferro a aquecer.

*Psicólogo clínico

Texto escrito de acordo com a nova ortografia
Leia mais na edição impressa ou torne-se assinante para aceder à versão digital integral deste artigo.