Sociedade

Elizabeth Sombart: “A música pode abrir portas para a grande dimensão que guardamos no nosso interior” (vídeo)

9 mai 2018 00:00

Entrevista | A pianista acompanhará Andrea Bocelli, em Fátima, no recital do 13 de Maio, passa primeiro por Leiria para dar dois concertos exclusivos. O JORNAL DE LEIRIA falou com Elizabeth Sombart sobre o seu trabalho e o que espera dos espectáculos.

Jacinto Silva Duro

Como surgiu o convite para acompanhar Andrea Bocelli em Fátima, justamente no 13 de Maio?
Recentemente, tocámos juntos em Bucareste (Roménia). Foi um concerto onde estabelecemos um entendimento profundo. Ele é um homem muito espiritual, que fala muito de Deus e que até tem a voz de um deus. Nesse dia, disse-me que iria a Fátima pelo 13 de Maio e convidou- me a acompanhá-lo. Resolvemos, logo ali, que iríamos tocar a Avé Maria, de Schubert.

Já visitou Portugal, anteriormente?
Sim. Já estive algumas vezes no País, em visita. É um local que me parece ser extraordinariamente sensível e dono de uma paisagem única e muito original. Quem não conhece Portugal, poderá acreditar que é igual a Espanha, mas não podia ser mais diferente. Portugal tem uma maneira de ser muito singular e muito maravilhosa. Por exemplo, adorei a Batalha e o seu mosteiro, o campo... e sim, também gostei dos circuitos turísticos, mas, acima de tudo, pude aperceber-me que ainda há um modo de viver muito simples e descomplicado, pleno de valores, que, noutros países desta Europa "tão moderna" nós já perdemos. Visitar as cidades da região; Leiria, Batalha e Fátima, fez-me sentir muito reconfortada. Além disso, as pessoas sabem acolher muito bem os estrangeiros, nos restaurantes e mesmo na rua. Há um sentimento muito autêntico.

E Fátima, a cidade onde irá tocar no 13 de Maio?
Sempre senti uma ligação forte, de uma maneira ou outra, com Fátima. Participei num filme que fala do "Terceiro Segredo", estive em Fátima com um grupo de amigos da Fundação Resónnace e foi uma experiência muito forte. Em casa, tenho uma imagem de Nossa Senhora de Fátima, de que gosto muito. Além disso, sinto- me muito próxima da figura do Papa João Paulo II e interessei-me muito pela ligação entre ele e Fátima, em especial, após o atentado que quase lhe custou a vida e cuja salvação ele atribuiu à intervenção de Nossa Senhora de Fátima.

Sente-se uma pessoa espiritual? Sente que tem uma relação forte com Deus?
Penso que sim. Como dizia o escritor alemão Johan Goethe, "quando se fala da humildade, é ela quem fala dela mesmo" e, quando falamos de Deus, é ele quem fala através das nossas palavras. Mais do que uma forte relação com Deus, tenho uma forte relação com Cristo e com o caminho que ele nos indicou, durante a sua passagem pela Terra. Para mim, esse é um o caminho belo, reconfortante e de consolo.

Que objectivos estão na base da Fundação Resónnace?
Temos como principal objectivo levar a música e a formação musical, dentro de um forte sentido de pedagogia, de reconhecimento da fenomenologia da música, de solidariedade, de transmissão de beleza, de excelência e consolo a alunos de escolas, a idosos em lares, a detidos em prisões, a crianças, cidadãos com deficiências psíquicas e em hospitais, campos de refugiados ou zonas de conflito. De um modo geral, a franjas da população que não têm acesso à beleza desta arte. Além disso, a Fundação, cuja sede é na Suíça, está representada na Bélgica, Espanha, França, Itália, Líbano e Roménia, apoia bolseiros e jovens "prodígio" que queiram aprender música e que não tenham condições económicas para o fazer.

O que espera alcançar com o concerto no Estabelecimento Prisional de Leiria (antiga prisão-escola)?
Pela minha experiência de tocar, em momentos anteriores, para pessoas que estão detidas e privadas da sua liberdade, gosto de pensar que posso auxiliá-las a atingir um espaço dentro de si mesmas, longe dos muros e da claustrofobia da prisão. Vejo-o como um lugar poético e de liberdade. A música é um mecanismo que permite a cada um entrar dentro de nós mesmos. Dentro daquilo que têm de melhor no seu âmago e superar-se, nesse espaço de liberdade, de beleza, de alegria e de criatividade que é só seu. A música, pela sua universalidade, pode ser apreendida por toda a gente e abrir portas para a grande dimensão que guardamos no nosso interior.

Tal como o fundador dos escuteiros, Lord Robert Baden- Powell, também pretende deixar o Mundo um pouco melhor do que o que encontrou? Vai dar um concerto a favor da região escutista de Leiria-Fátima, no dia 10...
Bom... não sei se conseguirei deixar o Mundo um pouco melhor, mas gostaria de ajudar a melhorar as almas de quem me escuta. No futuro, iremos assistir a mais iniciativas da sua Fundação Resónnace entre nós? Se me convidarem, não vejo por que não poderemos regressar e desenvolver trabalho em Portugal.

 

Perfil
Concertos em Leiria

Quando se lhe pede que enuncie o nome de três compositores favoritos, a resposta imediata da pianista francesa, Elizabeth Sombart, que irá acompanhar Andrea Bocelli num recital em Fátima, no 13 de Maio, é Bach, Schubert e Chopin, mas sublinha que apenas três é pouco.

"Poderia falar também em Mozart, Brahms e Schumann, entre outros. Amo-os e às suas obras." E porquê? "Porque amo o modo como cada um se dirige a Deus na sua música."

Aproveitando a vinda a Fátima, a 10 de Maio, irá dar um concerto solidário no Teatro José Lúcio da Silva, em Leiria, às 21 horas, cuja receita reverterá a favor dos escuteiros da região de Leiria. No dia 11, pelas 15 horas, a artista também dará um concerto pedagógico no Estabelecimento Prisional de Leiria (prisão-escola). Sombart iniciou os estudos de piano aos sete anos, no Conservatório de Estrasburgo.

Aos 11, fez a sua primeira actuação pública e venceu o Prémio Nacional de Piano e de Música de Câmara, aos 16 anos. Estudou piano com Bruno Leonardo Gelber e com Sergiu Celibidache, a sua referência maior, na Universidade de Mayence, onde aprendeu Fenomenologia da Música e agora faz masterclasses em parceria com o maestro Jordi Mora.

Em 1998, fundou a Fundação Résonnance, que oferece, gratuitamente, educação musical clássica/erudita. É Chevalier de l'Ordre National du Mérite (2006) e Chevalier de l'Ordre des Arts et des Lettres (2008).