Opinião

Dinheiro corrosivo

9 fev 2017 00:00

O dinheiro tem também a capacidade de contagiar com os seus malefícios as mais distintas áreas e meios, parecendo um polvo presente em todo o lado com os seus inúmeros tentáculos

Há séculos que é conhecido o poder corrosivo do dinheiro que face à fraqueza da natureza humana, quase sempre conseguiu impor a sua lei. Por ele cometeram-se os maiores crimes, fizeram-se revoluções, alimentaram-se guerras, criaram-se desavenças, de maior e menor porte, traíram-se princípios e valores.

Por dinheiro, Judas “ofereceu” Cristo aos romanos, numa passagem da Bíblia que serve bem como metáfora para o que desde sempre se foi observando um pouco por todo o Mundo e nas suas mais diversas sociedades. O grande problema é que, o dinheiro tem também a capacidade de contagiar com os seus malefícios as mais distintas áreas e meios, parecendo um polvo presente em todo o lado com os seus inúmeros tentáculos.

Neste caso, fala-se do tentáculo que invadiu o desporto, deitando completamente por terra os princípios preconizados por Coubertin que estiveram na génese dos Jogos Olímpicos modernos. Hoje, passados 80 anos sobre a sua morte, dificilmente alguém reconhecerá no desporto o espírito com que era encarado nessa época, tomado que foi pelas regras do negócio e pela lei do dinheiro. Com ela, surgiram inúmeros casos de doping, resultados combinados, suborno de árbitros e atletas, transacção de jovens jogadores como se de gado se tratasse.

Os milhões, muitos milhões, começaram a gravitar à volta do desporto, com muito desse dinheiro a ser de origem obscura e mais do que duvidosa. Apesar de tudo, por força do mediatismo alcançado, mas também por uma paixão irracional às vezes difícil de explicar, algumas modalidades desportivas são seguidas religiosamente por cada vez mais fiéis, tendose transformado nas últimas duas décadas em indústrias poderosíssimas em termos globais.

Pode ser que assim continue e que algumas modalidades continuem a crescer alheias aos escândalos que frequentemente as envolvem. Mas também poderá acontecer que, com o tempo, as pessoas comecem a desinteressarse por algo que desconfiam estar viciado.

Afinal, qual é o interesse de estar a acompanhar uma competição de ciclismo, atletismo ou natação, com dúvidas latentes sobre se o vencedor é um grande atleta ou se ganhou fazendo batota? Ou, com que tipo de paixão é possível seguir um jogo de futebol sabendo que há a probabilidade de o resultado estar combinado ou o árbitro comprado? E ainda, que satisfação há em acompanhar um campeonato de qualquer coisa, em que uma ou duas das equipas têm por trás delas um qualquer milionário árabe ou russo com dinheiro a perder de vista, sabese lá vindo de onde, que, num ápice, permite reunir os melhores, sem nada ter feito antes para os ter?

Toda esta reflexão vem a propósito da polémica que envolveu a última jornada da primeira fase do Campeonato Nacional de Seniores, em que uma das equipas marcou seis golos nos últimos 25 minutos de jogo, precisamente os que necessitava para passar à segunda fase, deixando a União de Leiria pelo caminho.

Naturalmente que não se está a dizer que houve batota, pois não há, para já, provas disso. Mas que é muito estranho, é!...