Opinião

Capitais há muitas… ou a moda da Cultura

3 mai 2018 00:00

Sobram para a cultura, na maior parte dos casos, alguns trocos, geralmente gastos com pouco critério e sem qualquer lógica subjacente a uma política bem fundamentada e com objectivos claros.

As manifestações de intenção em apresentar candidatura a Capital Europeia da Cultura em 2027 são tantas, que um visitante mais distraído, desses que agora desembarcam aos milhões no nosso País, poderá pensar que em Portugal a Cultura é coisa de primeira prioridade.

A última a ser conhecida foi a do Oeste, que manifestou intenção de candidatar uma das suas cidades, envolvendo toda a região no projecto, juntando-se, assim, a Leiria, Coimbra, Aveiro, Guarda, Viseu, Braga, Viana do Castelo, Cascais, Oeiras, Évora e Faro.

Ou seja, para os nossos autarcas a Cultura tornou-se, decididamente, moda, mesmo que a maioria deles pouco mais lhe dedique do que palavras simpáticas, como tanto de retórica como de demagogia.

Sumo espremido, sobram para a cultura, na maior parte dos casos, alguns trocos, geralmente gastos com pouco critério e sem qualquer lógica subjacente a uma política bem fundamentada e com objectivos claros.

Abundam, como é sabido, as recreações históricas, outra das modas, as programações compradas em pacote e os agora inevitáveis festivais, sejam de música sejam literários, numa lógica de replicação do que se faz nos concelhos vizinhos, como acontece também, por exemplo, com as pistas de gelo, as aldeias de Natal, os mercados medievais e as incubadoras de start-ups.

Ou seja, o que uns concelhos têm, os outros também querem ter, sem que haja a preocupação de fazer diferente, de experimentar outros caminhos, de apostar no menos óbvio.

Para a cultura, nomeadamente para a sua promoção junto da população, para o apoio à criação artística e para a preservação da nossa identidade, sobram, como já referido, as palavras bonitas de ocasião, sem que se percebam quaisquer medidas que a afirmem como uma prioridade, seja para a educação e desenvolvimento das pessoas, seja por objectivos económicos e turísticos, como outros países tão bem fazem.

Não se percebe bem, portanto, este súbito interesse de tantas cidades em ser Capital Europeia da Cultura, podendo, apesar de tudo, imaginar-se que seja uma de duas causas: ou há a consciência que o que se tem feito nessa área tem sido quase nada e quer-se inverter o rumo das coisas com um projecto desta importância como pano de fundo (um pouco como aconteceu com a Expo’98 na recuperação de uma parte degradada de Lisboa), ou então a falta de discernimento é tão grande que há a convicção de se estar a desenvolver bom trabalho e que chegou a altura de o mostrar à Europa.

Vamos acreditar que seja a primeira hipótese e que, de uma vez por todas, se coloque a Cultura no lugar que que é dela por direito, que é ‘só’ o que sempre distinguiu as grandes civilizações das outras, daquelas de quem a história não reza, pelo menos por boas razões.