Opinião

(Não) Balanço do ano

15 dez 2023 16:21

Continuam os longos espaços noticiosos dedicados ao futebol, longuíssimas horas de transmissões e comentários

Alguém que acorde de uma hibernação prolongada, alheio de calendários, saberá que estamos em Dezembro porque os sintomas são evidentes. A banda sonora à base de Mariah Carey, o aroma a bolo-rei, os picos de colesterol e diabetes só de imaginar a ceia de Natal, os típicos balanços do ano listando tudo desde momentos marcantes até às músicas mais ouvidas. Para não fugir à regra, faço hoje um desses exercícios. Mas, vou debruçar-me sobre o que não aconteceu este ano.

1. Começando pelo não acontecimento mais recente, ainda não decidimos onde será o novo aeroporto. Naturalmente que cinco décadas são escassas para decidir, e agora, após uma comissão técnica indicar a melhor solução, os políticos que nomearam a comissão vão refletir para, quem sabe um dia, decidir. Aliás, Montenegro já anunciou que vai nomear um comité para estudar o estudo, mas nada de lhe perguntaram pela opinião sobre o assunto.

2. Não foi clarificada a origem do repentino aumento de preços de... tudo. Depois das explicações longínquas (Covid, guerra na Ucrânia, guerra no Médio Oriente) assistimos ultimamente à saga do aumento exponencial do preço do azeite – nomeadamente do azeite de colheitas anteriores que estava em armazém. Não é que eu queira falar em especulação, mas penso que em breve haverá no TikTok especialistas a explicar como investir em azeite em vez de em criptomoedas: influencers azeiteiros, portanto.

3. A Igreja Católica não assumiu as suas responsabilidades nos casos de generalizados abusos sexuais de menores e de encobrimento sistémico dos casos. Desde a apresentação dos resultados do estudo da comissão que concluiu que foram abusadas, desde 1950, milhares de crianças por centenas de clérigos, nada foi feito. Depois de festival de Verão ao jeito de ação de limpeza de imagem, patrocinada por líderes políticos como Marcelo, Costa, e Moedas, soubemos há uns dias que a maioria dos clérigos suspensos na sequência do estudo já voltaram às suas funções. Tudo como dantes, quartel-general em Abrantes.

4. Em 2023 também não decorreu a normalização da relação do País com o futebol. Continuam os longos espaços noticiosos dedicados ao futebol, longuíssimas horas de transmissões e comentários. E, mais preocupante, a promiscuidade entre os dirigentes políticos (Presidente da República, primeiro-ministro, presidentes de câmara, etc.) e o futebol continua a ser alegremente exibida e premiada. O meu otimismo far-me-ia desejar que 2024 fosse o ano em que algumas destas coisas acontecessem. Mas, como já levo uns anos disto…