Opinião

Lições do frio

28 jun 2016 00:00

Já abordámos nestas crónicas, outrora mais assíduas, a questão finlandesa.

Este bom aluno, com um dos melhores sistemas de educação do mundo, conhecido pelo seu milagre tecnológico, cuja Nokia era a principal bandeira, é hoje uma das piores economias da zona euro, a registar o seu quarto ano de recessão (apesar disto, o foco dos “mercados” e das agências de rating é Portugal e Espanha, onde perigosos gastadores tomaram conta dos governos).

Assolados por uma quebra do PIB que automaticamente coloca a base da coleta de impostos num valor menor, os responsáveis finlandeses viram-se perante défices crescentes (as despesas dos Estados são relativamente inelásticas face às receitas). Desta forma decidiram seguir as mesmas receitas do Sul da Europa, implementando um programa de austeridade que permitiria realizar poupanças de cerca de 2% do PIB até 2019, principalmente através de cortes nos gastos.

Esta é uma solução no mínimo singular, tanto mais quando verificamos que uma economia anémica, com um desemprego acima de 10%, abaixo do seu PIB potencial, tem apenas 58% de dívida pública (face ao PIB), tendo portanto margem para políticas mais expansionistas (ao contrário dos países do Sul).

Ora, para um país com um nível de educação extremamente elevado, com um excelente índice de competitividade e transparência, o que poderá estar a correr mal?

Por um lado, poderíamos apontar alguns problemas que estão já a ser alvo de medidas (como a falta de flexibilidade no mercado de trabalho). Mas existem outros obstáculos – tal como Portugal e Espanha, a Finlândia partilha com a zona euro, uma moeda/política monetária que pode estar desajustada do seu momento económico, sem que existam mecanismos compensatórios para tal (como um mercado bancário comum, uma dívida comum ou um sistema fiscal e de segurança social comum).

Na verdade, as prescrições da política europeia são até antagónicas, pois no caso finlandês o Estado deveria mesmo seguir políticas fiscais expansionistas acompanhadas de desvalorizações cambiais (que tornariam os serviços de TI, mas também os produtos florestais e industriais do país, mais atrativos).

No fundo, nas amarras da zona euro, sem uma Europa única, muitos estão condenados a fracassos inevitáveis (sendo que, pelo menos em Portugal, ainda não se culpam os imigrantes).